16/05/2018 - 15:26

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O samba da nossa terra invade o MAR

16/05/2018 - 15:26

O samba da nossa terra invade o MAR

CLARA PASSI
O mais brasileiro dos ritmos ganhou status de obra de arte e tomou os salões do Museu de Arte do Rio (MAR), na Praça Mauá, na exposição O Rio do samba: resistência e reinvenção. Comemorativa dos cinco anos do museu, a mostra não tem a ligeireza de um amor de carnaval, muito pelo contrário. Ficará aberta até o dia 30 de março de 2019. A entrada é gratuita até o dia 28 de maio. A partir do dia seguinte, passará a custar R$ 20.

Num diapasão diferente dos clichês que cercam esse universo, o visitante terá a chance de viajar pela história do ritmo forjado pelo batuque dos africanos, pelo maxixe e pela polca russa e descobrir como ele floresceu nas rodas da Praça Onze no Século 19 e se tornou sinônimo de brasilidade e, acima de tudo, de carioquice até hoje.

São cerca de 800 itens. Há capas de discos raras e preciosidades como o prato de porcelana tocado por João da Baiana e joias originais de Carmem Miranda. Quadros de Cândido Portinari, Di Cavalcanti, Djanira, Heitor dos Prazeres, Guignard, Ivan Morais, Pierre Verger e Abdias do Nascimento; fotografias de Marcel Gautherot, Walter Firmo, Evandro Teixeira, Bruno Veiga e Wilton Montenegro; desenhos de Santa Rosa; gravuras de Debret e Lasar Segall; os parangolés de Hélio Oiticica e uma instalação de Carlos Vergara.

O MAR comissionou cinco obras especialmente para a mostra. Ernesto Neto e o carnavalesco da Mangueira, Leandro Vieira, criaram uma instalação interativa, Jaime Lauriano uma intervenção logo na entrada do museu, gravando nas pedras portuguesas os nomes das etnias africanas escravizadas no Brasil. A passarela que leva o visitante à sala de exposições foi tomada por letras de sambas que falam sobre o próprio samba e ambientada por uma peça sonora criada pelo músico Djalma Corrêa. Gustavo Speridião ocupa uma parede com uma obra inspirada na geografia do samba no Rio e João Vargas apresenta uma videoinstalação sobre o samba enquanto dança do corpo individual e coletivo.

Joãosinho Trinta é lembrado com uma fotografia inédita da alegoria Cristo-Mendigo sem o plástico que a cobriu durante o desfile da Beija-flor, em 1989. E Martinho da Vila também está representado em imagens do desfile Kizomba, festa da raça, que em 1988 rendeu à Vila Isabel o título de campeã do carnaval dos cem anos da abolição da escravatura no Brasil.

Mas o cantor, compositor e pesquisador de cultura africana Nei Lopes, um dos curadores da mostra, explica que tem buscado ir além da instituição escola de samba em suas reflexões sobre o ritmo. “Essa abordagem preferencial sempre reduz o objeto do nosso estudo ao evento carnavalesco. E o samba suscita outras questões maiores, como mercado musical, relações etnorraciais e de gênero”. E por que reafirmar a importância do samba, algo tão seminal para a construção de nossa identidade como brasileiros, neste momento tão conturbado da história do Brasil? Lopes responde: “Num país onde as opiniões são quase sempre moldadas por ações vindas de fora e até o lazer é controlado e dirigido de forma a agirmos de acordo com interesses externos, não podemos perder a oportunidade de mostrar que uma forma de manifestação cultural surgida um século atrás, na contramão do projeto ‘civilizatório’ da época, continua viva e pulsante como um dos principais, se não o maior, marcador da identidade brasileira”.

Se o foco do ensino de História nas escolas ainda é eurocêntrico e as crianças crescem tendo uma visão estereotipada do africano, sem nem suspeitar que os escravos que aqui aportaram eram, em sua maioria, bantus ou sudaneses, uma iniciativa como esta poderia ser vista como uma tentativa de reverter essa grave falha em nossa autoimagem. Mas Lopes não é tão otimista assim. Autor, entre outros livros, de um Dicionário de História da África que cobre o período que vai do Século 7 ao 16 e preparando outro, que vai até o século 19, Lopes tem se lançado ao desafio de mostrar a pujança de boa parte da África antes de ser cobiçada por potências de outros continentes. Na visão dele, é isto o que a juventude afrodescendente precisa conhecer, para construir uma autoestima saudável.
 
Serviço
  • MAR - Museu de Arte do Rio
    Praça Mauá, 5 – Centro
    Telefone: (21) 3031-2741
    Funcionamento: de terça a domingo, das 10h às 17h.
    De 28 de abril a 30 de março de 2019
    Entrada gratuita até 28 de maio. A partir de 29 de maio, o ingresso custará R$ 20
    Classificação livre

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