11/02/2014 - 18:07

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Educação em falta

11/02/2014 - 18:07

Educação em falta

Após crise que resultou no descreden ciamento de duas universidades do Rio, alunos questionam atuação do MEC e especialistas explicam direitos dos estudantes. Seccional interveio e aco mpanha processo de transferência
 
CÁSSIA BITTAR
 
O debate sobre a precarização do ensino superior ganhou novos ares em janeiro, com a notícia do descredenciamento, pelo Ministério da Educação (MEC), da Universidade Gama Filho e do Centro Universitário da Cidade, a UniverCidade. Tendo como razões citadas “a baixa qualidade acadêmica, o grave comprometimento da situação econômico-financeira da mantenedora [o Grupo Galileo Educacional, administrador das universidades] e a falta de um plano viável para superar o problema”, a ação do governo foi o ápice de uma crise que se estendia por mais de dois anos e que colocou em pauta o trabalho de fiscalização do MEC.

Os problemas começaram a repercutir em 2011, cerca de um ano depois de o Grupo Galileo adquirir a Gama Filho e meses após assumir a UniverCidade. Atraso no pagamento dos professores, demissões e aumento abusivo das mensalidades marcaram o período. Em abril de 2012, os docentes iniciaram a que seria a primeira das greves realizadas por conta dos salários atrasados. Com a queda da qualidade acadêmica e a falta de estrutura, alunos promoveram também uma série de manifestações, que incluiu a ocupação da reitoria da Gama Filho em julho de 2013.

Segundo o MEC, na ocasião foram tomadas medidas de supervisão com o intuito de superar a crise. Diante do descumprimento de um termo firmado para o saneamento das deficiências, foi instaurado processo administrativo em dezembro de 2013. “Apresentada a defesa, foram analisados a manifestação e os demais elementos constantes da supervisão e o MEC concluiu pelo descredenciamento de ambas as instituições com o objetivo de preservar o interesse dos estudantes e da sociedade por uma educação superior de qualidade”, afirma o ministério em nota da assessoria de imprensa. 

Com a decisão, o MEC apresentou aos universítários a proposta da transferência assistida, que permite o aproveitamento das matérias cursadas e a permanência em programas federais de acesso à educação superior. Porém, dos mais de 12 mil alunos afetados, a maioria não está satisfeita com a solução e parte reclama a federalização das universidades. 

Aluna do oitavo período de Direito na Gama Filho, Carolynne Said salienta que os estudantes estão enfrentando problemas: “Perdi três estágios importantes porque não pude ter acesso aos meus documentos acadêmicos. E, até agora, o MEC não nos ajudou a disponibilizá-los, não nos deu o amparo necessário. A única instrução foi a de esperarmos para que surja uma possível transferência no mês de março”.

Preocupada com a garantia dos direitos dos alunos, a OAB/RJ agiu e interveio junto ao ministério e às universidades, sendo convidada a fazer parte da comissão de implementação e acompanhamento do processo de transferência assistida dos discentes (leia mais no box).

Defensor da fiscalização por parte do MEC, o presidente da OAB/RJ, Felipe Santa Cruz, ressaltou a necessidade de cautela para que os jovens não tenham suas vidas acadêmicas e profissionais prejudicadas: “Lamentamos a crise de importantes referências no ensino do Rio de Janeiro e, em especial, nos inquieta o destino dos atuais alunos, muitos também estagiários e que precisam do diploma para suas contratações definitivas”.

De acordo com a presidente da Comissão de Ensino Jurídico da OAB/RJ, Ana Luisa Palmisciano, a legislação assegura aos alunos o aproveitamento dos estudos feitos até o momento do descredenciamento. “Esses estudantes também têm direito de acesso aos diplomas, no caso de conclusão de curso, ou a toda a documentação necessária para a transferência para outra instituição de ensino superior. Caso não sejam disponibilizados, os documentos podem ser requeridos por meio de medidas judiciais”, afirma.

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Universidades Privadas, instaurada pela Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), concluiu em abril do ano passado que o Grupo Galileo cometeu crime de apropriação indébita de recursos dos docentes das duas entidades. Em relação à Gama Filho, também não foram aplicados nas formas exigidas pelo MEC os financiamentos públicos obtidos por meio de programas do governo federal.

Para o presidente da Comissão de Direito à Educação da Seccional, Mário Miranda, é preciso incrementar os mecanismos de fiscalização diante do atual cenário: “A expansão do ensino superior, pressionada pela demanda diante do crescimento econômico, exige novos esforços de regulação, acompanhamento e avaliação para que não se chegue a uma situação tão drástica quanto o descredenciamento”.
 
Avanços no ensino jurídico 
 
Em março de 2013, o Conselho Federal e o MEC firmaram um acordo de cooperação técnica para realizar estudos visando ao estabelecimento de um marco regulatório do ensino jurídico. A partir de então foi promovida uma série de audiências públicas pelo país. Num dos encontros, na sede da OAB/RJ, foi sugerido que os critérios de autorização, reconhecimento e renovação dos cursos jurídicos exijam a demonstração de regularidade das instituições de ensino com as obrigações trabalhistas e fiscais.
 
O MEC informa que em janeiro foram iniciadas as visitas presenciais aos cursos e instituídas duas subcomissões para o desenvolvimento dos trabalhos: uma com o objetivo de sugerir revisão das diretrizes curriculares do curso de Direito e outra para tratar do aperfeiçoamento dos instrumentos de avaliação e do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade). “A previsão é que elas apresentem as sugestões em três meses”, diz o ministério através de sua assessoria de imprensa, frisando que desde a assinatura do acordo o governo não tem autorizado a abertura de novos cursos de Direito.
 
OAB/RJ acompanha  transferência assistida
 
Após enviar ofício solicitando às universidades que fossem expedidos os documentos necessários para as transferências, de forma a assegurar aos alunos a matrícula em outras instituições antes do início do período letivo, a OAB/RJ reuniu um grupo, composto pelas comissões de Direito à Educação, de Ensino Jurídico e de Seleção e Inscrição, para tratar do assunto.
 
No dia 24 de janeiro, em reunião do presidente da Comissão de Direito à Educação, Mário Miranda, com representantes do MEC, em Brasília, a Seccional foi convidada a integrar a comissão de implementação e acompanhamento do processo de transferência assistida, instaurada pela pasta e composta por representantes das secretarias de Regulação e Supervisão da Educação Superior (Seres) e de Educação Superior (Sesu), entre outros órgãos e instituições.

Algumas das atividades do grupo são: realizar diagnóstico das condições de transferência e recepção dos alunos, acompanhar as medidas efetivas para transferência e início das atividades letivas das instituições receptoras.

Na ocasião, Miranda levou ao MEC reclamações recebidas de alunos e sugeriu um incremento no número de vagas reservadas à transferência externa nas universidades públicas, além da quantidade de vagas previstas para as entidades privadas. “A intenção é buscar um equilíbrio diante do posicionamento atual do órgão, contrário ao pleito dos estudantes pela federalização”, explica o advogado.
 
 

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