14/10/2015 - 16:55

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Cota para mulheres no Legis lativo

14/10/2015 - 16:55

Cota para mulheres no Legis lativo

Contra reserva para qualquer representação parlamentar

Bruno Covas*
O que aqui se discute não é o não reconhecimento à clara e óbvia importância da participação das mulheres como instrumento de mudança e avanço do país. Ter representantes femininas em número cada vez maior, na política, é, mais do que desejável, necessário. Uma luta por igualdade travada diariamente. Em vários espaços: privado e pessoal. Com conquistas inegáveis, mas flagrantes injustiças, como salários inferiores aos dos homens no desempenho de funções iguais, agressões, violações morais e, finalmente, representação política.

Cabe, no entanto, uma discussão, esta sim com um tema, a meu ver, controverso: a representação feminina imposta por cotas. Que legitimidade uma mulher teria eleita por cotas? A quem ela estaria representando,  com uma eleição possível de poucos votos?  

Não podemos perder de vista que o Parlamento compõe-se de representantes do povo. O artigo 45 da Constituição diz exatamente isso em relação à Câmara dos Deputados. Mas nosso próprio sistema já tratou de criar algumas distorções dessa representação popular. O parágrafo 1º do artigo citado, por exemplo, estabelece um piso de oito e um teto de 70 deputados por estado. Isso faz com que um deputado federal do Acre represente 100 mil brasileiros e um de São Paulo represente quase 630 mil.

Outra distorção vem das chamadas coligações proporcionais, que infelizmente o Congresso manteve na última discussão da reforma política. Esse estratagema faz com que o candidato B do partido 2 seja eleito com os votos dados ao candidato A do partido 1. 

Não podemos corrigir uma injustiça histórica da nossa sociedade machista com uma solução que amplia a mencionada distorção e vai, cada vez mais, alargando o problemático fosso entre representante e representado no Brasil.

Entendo que imposição de candidatas por cota acabaria tendo efeito contrário. Aliás, não somente a cota para mulheres, mas qualquer uma relacionada à representação parlamentar fere o princípio da soberania do voto. Cabe somente ao povo a decisão sobre a composição das assembleias que os representa e não ao Congresso pré-determiná-la.

Por isso, vejo com bons olhos que a reforma eleitoral aprovada e que aguarda sanção ou veto da presidente da República traga dispositivos nesse sentido. Cito três: 1) a inclusão do artigo 93-A na Lei 9504/97 para determinar que o Tribunal Superior Eleitoral promova campanhas publicitárias por cinco minutos diários, durante quatro meses ao ano, para “incentivar a participação feminina na política”; 2) a alteração do artigo 45 da Lei 9096/95 para garantir às mulheres 20% do tempo institucional de rádio e TV que os partidos têm direito; 3) o estabelecimento de regra que obrigue os partidos a direcionar um percentual mínimo do fundo partidário a que têm direito para financiar campanhas das suas candidatas.

Para que exista uma participação feminina mais efetiva nos processos eleitorais e, consequentemente, nas instâncias de poder, é preciso que os partidos políticos sejam obrigados a resolver essa questão. Mas é necessário também que as mulheres se aproximem, se apropriem das principais demandas das comunidades, da cidade, do estado onde vivem. Participem dos debates e das discussões das políticas públicas e, finalmente, sejam eleitas pelo único caminho legítimo dos regimes democráticos: a escolha popular.
 
*Advogado e economista, deputado federal pelo PSDB/SP
 
Por uma nova política com igualdade de gêneros

Maria do Rosário*
No Brasil, as mulheres representam 52% do eleitorado e 45% do mercado de trabalho, mas ocupam somente 10% das cadeiras da Câmara dos Deputados, 16% do Senado e 11% das assembleias legislativas. Este desequilibro é causado por múltiplos fatores, desde o acesso desigual a recursos de financiamento das candidaturas a fatores culturais de opressão da participação feminina. Ocupamos o 118º lugar no ranking global da presença feminina nos legislativos. 

Foi visando à superação deste quadro que foram criadas as cotas de gênero, que estabeleceram que no mínimo 30% das vagas das listas deveriam ser reservadas para as mulheres. A primeira eleição em âmbito federal com cotas foi em 1998. Na ocasião, o percentual de mulheres eleitas caiu de 6,2% para 5,6%. Essa queda foi superada em 2002, mas o crescimento do número de eleitas segue inexpressivo, indicando que a legislação não obteve o sucesso esperado. Cabe-nos, portanto, analisar as razões e buscar alternativas.

O sistema político brasileiro de lista aberta sem ordenação de preferências contribui para que o impacto das cotas seja reduzido, pois é previsto apenas que as mulheres componham as listas, e não que sejam alocadas em posições competitivas tal como em países com cotas de gênero e listas fechadas. Caso da Argentina, que hoje tem 36% de representação feminina em sua Câmara Baixa.

Para além deste aspecto, no Brasil é permitida aos partidos a apresentação de até 150% de candidatos em relação ao número de cadeiras em disputa, percentual considerado uma “cláusula de escape”, pois permitia até que fossem formadas listas sem mulheres, sem que isso implicasse o descumprimento da lei. Apenas a partir da aprovação da minirreforma eleitoral (Lei 12034/2009), a expressão “reserva” foi substituída por “preenchimento” de vagas.

A despeito desses fatores, hoje a maior dificuldade para as mulheres não é obter a candidatura, e sim de ter condições políticas e materiais de disputar de forma competitiva. Dados da pesquisa de Teresa Sacchet e Bruno Speck apontam que em 2010 a arrecadação das candidatas a deputadas estaduais foi 37% menor do que a dos candidatos, enquanto na disputa à Câmara dos Deputados as mulheres tiveram uma arrecadação 53% inferior aos homens.

A distribuição desigual de recursos financeiros e a manutenção da esfera privada como âmbito de responsabilidade exclusiva da mulher, mesmo diante de sua incorporação no mercado de trabalho, além dos poucos mecanismos de responsabilização do Estado nessa esfera, dificulta a construção das carreiras políticas femininas e sua participação em espaços de poder. Trata-se de quadro complexo, no qual o enfrentamento à sub-representação feminina se apresenta como um grande desafio. 

Diante deste cenário, é hora de irmos além das vagas nas listas, é preciso que estabeleçamos avanços na estrutura de representação política do país, assegurando que ela se democratize ainda mais para o enfrentamento das desigualdades. Medida importantíssima nesse sentido foi a resposta do STF ao questionamento da OAB sobre o financiamento das campanhas eleitorais.

Outra medida importante estaria na aprovação da reserva de cadeiras nas casas legislativas para as mulheres, numa proporção nunca abaixo dos 30%. Números mais modestos compõem a proposta aprovada pelo Senado, mas ainda assim a iniciativa da bancada feminina e a mobilização dos movimentos de mulheres do Brasil são fundamentais para que venhamos a garantir a presença de quem representa mais de 50% da população brasileira e segue distante dos espaços de poder.
 
*Deputada federal (PT/RS)

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