03/08/2018 - 21:00

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Em votação na Câmara, PEC que impede aposentadoria de juízes como medida máxima de punição suscita polêmica

03/08/2018 - 21:00

Em votação na Câmara, PEC que impede aposentadoria de juízes como medida máxima de punição suscita polêmica

Em votação na Câmara, PEC que impede aposentadoria de juízes como medida máxima de punição suscita polêmica


PATRÍCIA NOLASCO

Sob forte pressão favorável da advocacia e da opinião pública e contrária, da magistratura, deve ir a votação em novembro, na Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados, o parecer do relator Eliseu Padilha (PMDB/RS) à Proposta de Emenda Constitucional – PEC 505/2010 que impede a concessão de aposentadoria compulsória como medida máxima de punição administrativa para juízes que cometeram irregularidades.

Oriunda do Senado, onde foi aprovada por unanimidade em julho, a PEC, de autoria da senadora Ideli Salvatti (PT/SC), modifica os artigos 93 e 95 da Carta e exclui da relação de punições aplicáveis aos juízes a chamada "aposentadoria por interesse público", e também permite a perda de cargo do magistrado ou membro do Ministério Público por decisão de dois terços dos integrantes do tribunal ou conselho ao qual esteja vinculado. De acordo com a assessoria de Padilha, seu relatório deve ser apresentado no início de novembro.

Para o presidente da OAB/RJ, Wadih Damous, é urgente e necessário que a lei seja modificada para que a aposentadoria compulsória não mais represente uma "premiação" para juízes que praticaram delitos. Ele lembra os casos de Paulo Medina, ministro do Superior Tribunal de Justiça, e José Eduardo Carreira Alvim, ex-vice-presidente do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, acusados de vender sentenças para a máfia dos caça-níqueis e aposentados pelo Conselho Nacional de Justiça com direito a proventos integrais, como permite a legislação em vigor.

Mas, para as entidades da magistratura, a PEC fere garantias constitucionais, como a vitaliciedade no cargo, cuja perda só pode ocorrer por sentença judicial transitada em julgado, como prevê a Carta, e não administrativamente, por decisão de dois terços do tribunal ao qual se vincula, de acordo com a proposta de emenda a ser votada.

"Toda vez que se tenta fragilizar o Judiciário, é a sociedade que fica vulnerável", diz o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Mozart Valadares. "As garantias da vitaliciedade e na inamovibilidade do juiz existem para que seja imune aos poderosos e possa julgá-los sem medo", diz ele, citando como exemplo a recente decretação de prisão do governador do Amapá e de integrantes da cúpula do poder no estado, todos acusados de desvio de recursos. "E se os juízes não tivesse imunidade? Quem garan- Mozart Valadares, da AMB, é contra a mudança te que poderiam ser independentes para aplicar a Justiça?", questiona, acrescentando outros casos, como os julgamentos dos candidatos fichas-sujas e as multas aplicadas pelo Tribunal Superior Eleitoral durante a campanha.

A AMB, com outras entidades da categoria, quer que a PEC seja discutida em audiências públicas para que a magistratura possa apresentar seus argumentos contrários à mudança na Constituição. "Nós não temos compromisso com a impunidade, mas não podemos aceitar a fragilização da magistratura", afirma Valadares.

Em setembro, o Conselho Nacional de Justiça emitiu nota técnica contra a aprovação da PEC, que, segundo o CNJ, é inconstitucional e enfraquece a atuação do órgão. "A proposta elimina a primeira das garantias de independência da magistratura, consistente em não poder o magistrado perder o cargo senão em virtude de sentença judiciária", diz o texto. Na nota, os conselheiros argumentam que "a proposta dá um passo atrás ao reconstruir o monopólio do controle disciplinar pela própria magistratura, retirando do Conselho Nacional de Justiça, órgão de composição democrática, com representação do Ministério Público, da advocacia e do Poder Legislativo, a competência para aplicar a mais grave das sanções disciplinares".

Do lado oposto, a advocacia acredita que a interpretação dos juízes é equivocada. "A vitaliciedade é garantia da magistratura e da independência do Judiciário, não pode ser interpretada como um mecanismo para garantir privilégios por uma casta de servidores, assim como não pode representar um sinal verde para a corrupção", argumenta Wadih.

Na mesma linha raciocina a senadora Ideli Salvatti, para quem a concessão da aposentadoria como pena para o magistrado flagrado praticando atos de corrupção "é algo absolutamente incompatível com as regras previstas para os demais servidores públicos". Ela diz que, para a sociedade, "isso não é pena, é prêmio".

A senadora sustenta que a mudança proposta não fere a Constituição: "O mesmo dispositivo que assegura aos magistrados a vitaliciedade prevê também as vedações que os mesmos devem observar, ou seja, as garantias e deveres dos magistrados caminham lado a lado. A vitaliciedade não é absoluta e encontra suas limitações na própria Constituição".

Ideli explica ainda que a PEC não prevê a perda dos valores recolhidos pelos magistrados para a aposentadoria, "apenas impede que o juiz corrupto seja presenteado com a aposentadoria proporcional". "Aquele que for punido por ato de corrupção deve ser excluído da carreira e somente conquistar a sua aposentadoria após ter contribuído para isso e ter completado a idade prevista em lei, como qualquer trabalhador", argumenta.

Ela contradita o argumento da magistratura sobre a probabilidade de fragilização do Judiciário. "Muito pelo contrário, a proposta fortalece o Poder na medida em que acaba com algo que, injustamente, vem comprometendo sua credibilidade, que é a aplicação da pena de aposentadoria para juízes flagrados cometendo atos de corrupção. A aprovação da PEC excluirá essa anomalia do ordenamento, garantindo que os corruptos sejam efetivamente punidos. Isso prestigia o bom magistrado, aumentando a confiança da sociedade do Judiciário", finaliza.


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