03/08/2018 - 20:58

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A recentíssima Lei do Mandado de Segurança: alguma novidade?

03/08/2018 - 20:58

A recentíssima Lei do Mandado de Segurança: alguma novidade?

A recentíssima Lei do Mandado de Segurança: alguma novidade?

 

Fernanda Medina Pantoja e Diogo Rezende de Almeida*

 

Após oito anos de tramitação no Congresso, foi promulgada a nova Lei do Mandado de Segurança (Lei nº 12.016/09), em substituição ao diploma de 1951, cuja longevidade, diante das notórias mudanças por que passou o Processo Civil brasileiro, já o tornara obsoleto. De iniciativa do então presidente Fernando Henrique Cardoso, em conjunto com o ministro Gilmar Mendes (àquela época advogado-geral da União) e o Ministério da Justiça, a lei foi idealizada pelos professores Caio Tácito, Arnoldo Wald e o ministro (então do STJ) Carlos Alberto Menezes Direito.

 

Conservando os traços fundamentais do instituto, o texto consolidou a jurisprudência cristalizada dos tribunais, bem como unificou as diversas normas existentes sobre a matéria, dispersas tanto na legislação extravagante que se seguiu à Lei nº 1.533/51 quanto na própria Constituição Federal de 1988, à qual coube a criação da modalidade coletiva do mandado de segurança. Ultimaram-se, pois, poucas novidades na sistemática do instituto.

 

Foram abraçados os entendimentos dominantes na jurisprudência, por exemplo, em relação às autoridades passíveis de mandado de segurança; aos atos contra os quais é vedada a concessão da medida; à possibilidade de se agravar da decisão concessiva ou denegatória da liminar e à previsão de manutenção dos seus efeitos até prolação da sentença, salvo se cassada ou revogada.

 

Em outras matérias, posicionou-se o legislador no sentido de estender à autoridade coatora o direito de recorrer; afastar a cominação de nulidade do processo quando não se manifeste o Ministério Público e exigir o ingresso da pessoa jurídica de direito público interessada como litisconsorte necessária.

 

Não obstante, o texto incorporou leis não recepcionadas pela Carta Constitucional de 1988, relativas a vedações de concessão de liminar nos casos específicos já previstos nas aludidas leis (quando tiver por objeto a compensação de créditos tributários, entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, reclassificação ou equiparação de servidores públicos e concessão de aumento ou extensão de vantagens ou pagamento de qualquer natureza), sem que, ao menos, constassem as interpretações menos rigorosas já consolidadas pelos tribunais nas últimas décadas.

 

Tal proibição (que, por força de lei, abrange também as tutelas antecipadas em outros ritos) frustra a atual expectativa de acesso à Justiça efetivo e tempestivo, segundo o qual a tutela jurisdicional deve ser concedida indistintamente àqueles cujos direitos estão amparados por lei, além de mitigar o próprio escopo do writ como remédio constitucional contra arbítrios do Estado.

 

Outro ponto polêmico encontra-se na norma que faculta ao juiz exigir, do impetrante, caução, fiança ou depósito, com o fim de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica. Em que pese o risco gerado pela outorga de poder discricionário ao julgador para avaliar a necessidade de garantia, parece-nos adequada a alteração, desde que utilizada com parcimônia, e não para legitimar a concessão de liminar quando o direito líquido e certo não restar demonstrado, nem para negar a tutela aos desprovidos de recursos.

 

É curioso notar que a demora no trâmite legislativo fez com que a lei já nascesse em descompasso com as normas que regem o processo eletrônico, ao permitir a impetração por esse meio apenas em caso de urgência e exigir a apresentação do original impresso nos cinco dias úteis subsequentes.

 

A despeito da mobilização dos advogados contra o dispositivo que veda a condenação em honorários, o manteve a nova lei, na esteira da jurisprudência do STF e do STJ. Embora consentânea com as feições constitucionais do mandamus, a norma pode ter eficácia perniciosa, eis que o ônus recairá exclusivamente sobre aquele cujo direito foi lesado, e não sobre o sucumbente.

 

Finalmente, grande novidade traduziu-se no tratamento do mandado de segurança coletivo, que ainda não fora regulamentado pela lei ordinária. Preservaram-se, em geral, as regras aplicáveis às ações coletivas e o entendimento sufragado nos tribunais, esclarecendo-se, porém, que o Mandato de Segurança se presta apenas à defesa de interesses coletivos e individuais homogêneos. Deixou-se apenas de prever que a impetração coletiva não prejudica a individual, em caso de denegação, como fora sugerido pela comissão de juristas no anteprojeto que deu origem à lei.

 

*Fernanda Medina Pantoja e Diogo Rezende de Almeida são advogados e mestres em Direito Processual pela Uerj 


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