03/08/2018 - 21:02

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Popularização da internet impõe novos desafios à proteção da intimidade

03/08/2018 - 21:02

Popularização da internet impõe novos desafios à proteção da intimidade

Popularização da internet impõe novos desafios à proteção da intimidade


Dois anteprojetos de lei que têm como objetivo regulamentar a utilização dos dados dos usuários na rede virtual vão ser enviados ao Congresso ainda neste ano

As mudanças advindas da popularização da internet, e, sobretudo, do surgimento das redes sociais, radicalizaram o contexto da proteção dos dados privados. Antes praticamente restritas a cadastros comerciais, as informações pessoais passaram a ser solicitadas a todo momento no mundo virtual. A facilidade de coleta, armazenamento e monetarização de tais informações proporcionaram a criação de bancos de dados de proporções globais, modificando definitivamente as relações comerciais e tornando essencial, segundo boa parte dos juristas, a criação de legislação específica visando a proteger tanto empresas quanto usuários.

A proteção da intimidade do indivíduo não é tema novo. Desde a década de 1970, Estados Unidos e Europa, por exemplo, já possuem normas sobre o assunto. No Brasil, o assunto é abordado tanto na Constituição Federal, que trata da privacidade do indivíduo em seu artigo 5º, quanto na legislação infraconstitucional, como os códigos Civil e de Defesa do Consumidor. As novas tecnologias, contudo, geraram novas demandas e a necessidade de leis menos setoriais, adequadas à nova realidade. O Ministério da Justiça, em parceria com o Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da FGV, elaborou dois anteprojetos de lei que buscam regulamentar a rede com base nos direitos fundamentais e criar uma lei geral de proteção dos dados pessoais e que trata da privacidade na rede.

O advogado Carlos Affonso Pereira de Souza é coordenador do Centro de Tecnologia e Sociedade da FGV Direito Rio e participou da produção dos dois anteprojetos, que serão enviados ao Congresso Nacional este ano. Segundo ele, a expectativa é que sejam votados ainda em 2011. "O fato de ambos terem sido disponibilizados na internet para debate público já é um avanço. Isso demonstra um claro alinhamento com as novas tecnologias e legitima ainda mais o texto, já que opinaram os verdadeiros interessados", afirma. De acordo com Carlos Affonso, a privacidade, antes considerada o direito ao isolamento, aparece hoje como a forma de tratamento dos dados pessoais de cada um. "As informações particulares são muito valiosas atualmente. É necessário cuidado com sua utilização", completa ele, que integra também a Comissão de Direito Autoral, Direitos Imateriais e Entretenimento da Seccional.

Web 2.0 é o termo criado para denominar uma segunda geração da internet, baseada cada vez mais na troca de informações e maior colaboração do usuário, que passa, além de consumir, a produzir conteúdo. Principais exemplos deste conceito, as redes sociais se tornaram grande atrativo, não só para pessoas a fim de interagir e se informar como para empresas que procuram aumentar sua base de dados, um dos principais fatores de valorização nos dias que correm. "Cada informação postada pelo usuário é um passo para criar seu perfil e personalizar sua navegação com produtos e ofertas. É a chamada publicidade comportamental", explica Carlos Affonso.

Além de entreter e informar, as redes sociais podem se transformar em fontes de problemas se não forem tomadas algumas precauções. Foi o caso de Solange Coutinho, estudante de 25 anos e entusiasta do Facebook, que, sem maiores preocupações, disponibilizava, em seu perfil, muitos dados particulares. Quando começou a receber insistentes mensagens de um desconhecido, veio a preocupação. Aconselhada por amigos, bloqueou e denunciou a pessoa no próprio site, além de desativar o e-mail pelo qual recebia os recados. Bastou para que o incômodo cessasse. Solange mudou de postura após o ocorrido. "Passei a restringir o acesso às minhas informações", diz.

De acordo com Carlos Affonso, a postura dela foi correta e, caso o problema persistisse, atitudes mais drásticas poderiam ser tomadas. "Vários estados brasileiros já possuem delegacias especializadas em crimes na internet", informa. Ele recomenda, ainda, que o usuário que deseje ir a juízo reúna provas. "É recomendável a impressão da página e até a obtenção de uma ata notarial relatando o ocorrido", orienta.

Os anteprojetos elaborados têm por objetivo regular melhor as situações, definindo mais claramente os limites para todos e ajudando, inclusive, na decisão de magistrados. Um exemplo é a criação do conceito de "dados sensíveis". Considerado um dos avanços do texto, o inciso IV do art. 4º define que "dados sensíveis são dados pessoais cujo tratamento possa ensejar discriminação do titular, tais como aqueles que revelem a origem racial ou étnica, as convicções religiosas, filosóficas ou morais, as opiniões políticas, a filiação sindical, partidária ou a organizações de caráter religioso, filosófico ou político, os referentes à saúde e à vida sexual, bem como os dados genéticos e biométricos". O anteprojeto inclui um capítulo que dispõe especificamente sobre o tratamento de tais informações, estabelecendo, entre outras coisas, que é proibida a utilização dos dados, salvo por autorização expressa de seu titular.

A presidente da Comissão de Direito e Tecnologia da Informação (CDTI) da OAB/RJ, Ana Amélia Menna Barreto, lembra que os membros da comissão analisaram a minuta do anteprojeto e aguardam apenas a conclusão do texto legislativo pela SAL (Secretaria de Assuntos Legislativos) do Ministério da Justiça, para submeter ao presidente da OAB/RJ, Wadih Damous, a realização de um debate público na Seccional. Segundo ela, foram feitas algumas ressalvas, como a omissão quanto à regulamentação imediata sobre o estabelecimento de composição, estrutura e atribuições do Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais, cuja criação é prevista no texto. "Essa autoridade central deve obrigatoriamente ser independente, conceber composição paritária, incluindo representantes de setores interessados e sociedade civil", salienta.


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