05/10/2008 - 16:06

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Voto facultativo volta ao debate, mas encontra séria resistência

Voto facultativo volta ao debate, mas encontra séria resistência

 

 

Do Jornal do Brasil

 

05/10/2008 - A presença do eleitor nas urnas daqui a quatro anos, na próxima eleição municipal, pode deixar de ser obrigatória. Líderes da base governista esperam emplacar nas discussões da reforma política - programadas para 2009 - um debate sobre o voto facultativo. Tema de 17 propostas de emenda à Constituição que repousam nas gavetas da Câmara e do Senado, a idéia é considerada polêmica, mas pode ganhar fôlego desta vez porque tem um diferencial: o eleitor é quem vai decidir sobre a manutenção ou não do voto obrigatório.

 

A nova proposta de voto facultativo ganha contornos com o deputado Geraldo Magela (PT-DF) e prevê um plebiscito para o cidadão opinar sobre a questão. Magela contabiliza o apoio de 130 parlamentares e argumenta que o sistema eleitoral brasileiro precisa ser revisto para acompanhar as transformações do mundo. Dos 193 países com eleições diretas, apenas 30 obrigam seus habitantes a votar - a maioria está na América do Sul e teve sua vida política pautada pelo autoritarismo e golpes de Estado.

 

"Ninguém melhor do que o eleitor para julgar a questão. Nós temos, hoje, uma bagagem cultural, um avanço político que nos permite evoluir", afirma o petista

 

Outro argumento que surge entre os parlamentares que defendem o voto facultativo, como o deputado Fernando Gabeira (PV-RJ), candidato a prefeito do Rio, é que o voto não é obrigatório, mas sim, o registro como eleitor e o comparecimento nas urnas.

 

"O cidadão chega ali e deixa de votar, ou simplesmente opta pelo voto branco na urna, ou anula o voto; não exercita efetivamente seu direito de votar, às vezes, até contrariado por esse caráter de obrigatoriedade", diz o senador Leomar Quintanilha (PMDB-TO).

 

 

Resistência

 

A mobilização, no entanto, promete encontrar resistência por todos os lados, mas especialmente no Senado. Por lá, três PECs sobre o voto facultativo avançaram pelas comissões, mas nunca chegaram ao plenário. A mais recente recebeu aval em junho deste ano, quando a Comissão de Direitos Humanos e Participação Legislativa (CDH) converteu em proposta de emenda constitucional uma sugestão feita por uma associação comunitária em favor do voto facultativo.

 

O texto - apresentado pela Associação Comunitária de Chonin de Cima (Acocci), de Governador Valadares (MG) - propõe alterar o artigo 14 da Constituição, que torna o voto obrigatório e mantém a obrigatoriedade de o cidadão tirar e guardar o título de eleitor, mas o livra da obrigatoriedade de votar.

 

A matéria aguarda votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.

 

"Eu vejo que, no processo de aperfeiçoamento da democracia, podemos considerar como didático que tenha havido o voto obrigatório desde a (promulgação) da Constituição de 1988", avalia o senador Eduardo Suplicy (PT-SP), que relatou a proposta na CDH. "Mas, acho que podemos passar para o estágio do voto facultativo", completa ele.

 

Agora, a proposta deve encontrar dificuldade para tramitar na CCJ. O presidente da comissão, senador Marco Maciel (DEM-PE), ex-vice-presidente da República, lidera a tropa de choque contra o fim do voto obrigatório. Acredita que a obrigatoriedade do voto tem uma função social porque obriga o candidato a interagir com o eleitor, especialmente o de baixa renda. "Sou a favor do voto obrigatório porque ele se identifica com a cidadania. Tenho receio de que voltemos aos tempos do voto do cabresto, com vantagens financeiras, pessoais, se sobrepondo a ideologia política", pondera Maciel.

 

Na avaliação dos parlamentares contrários ao voto facultativo, o baixo índice de comparecimento nas urnas seria um outro ponto desfavorável. "É uma omissão", comenta Maciel. "Nós temos que trabalhar pelo fortalecimento do sistema partidário, do sistema eleitoral como um todo e não retrocedermos".

 

A prática pode não corresponder às experiências de outros países. Pesquisa encomendada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) ao Instituto Vox Populi revelou que 51% dos entrevistados disseram que votariam mesmo sem a obrigatoriedade, enquanto outros 11% "provavelmente votariam". A resposta oscilou de acordo com a região. No Sul e no Norte, os que "com certeza" votariam somam 60%, enquanto no Nordeste o índice cai para 47% e, no Sudeste, para 48%. Já no Centro Oeste, 55% votariam "com certeza".

 

Se o voto fosse facultativo, 38% dos eleitores não iriam às urnas registrar sua preferência. Entre esses, 30% disseram que "com certeza não iriam votar" e 8% que "provavelmente não iriam votar". A pesquisa foi realizada entre 27 de junho e 6 de julho com o objetivo de traçar um perfil do eleitor brasileiro. Das 1.502 pessoas consultadas em todas as regiões do país, apenas 1% disse não saber o que responder.

 

Para Magela, os números não surpreendem: "O voto facultativo aprimora a democracia porque vota o eleitor consciente, que tem participação na vida política do país"

 

 

TSE

 

As discussões sobre o voto facultativo também devem movimentar o meio eleitoral. E ao que tudo indica as restrições ao debate devem ser menores. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Carlos Ayres Britto, deu o tom das articulações. Britto compartilha da teoria de Magela e defende o fim do voto obrigatório.

 

"Eu entendo que temos um encontro marcado com esse tema no futuro e a legislação consagrará, como em outros países, a voluntariedade do voto", afirmou o presidente do TSE. "O eleitor comparecendo porque quer participar efetivamente do processo eleitoral e se engajando nas campanhas com mais conhecimento de causa e determinação pessoal".

 

Mas o presidente do TSE acredita que antes dessa transformação no sistema eleitoral é preciso que o desenvolvimento econômico alcance uma maior parcela da população e que a democracia se fortaleça.

 

"Como rito de passagem, a obrigatoriedade do voto deve permanecer ainda por mais tempo", pondera Britto. "Até que a democracia se consolide e que a economia chegue mais para todos".

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