16/05/2008 - 16:06

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Para Supremo, varas especializadas são constitucionais

Para Supremo, varas especializadas são constitucionais

 

 

Do site do Consultor Jurídico

 

16/05/2008 - O Conselho da Justiça Federal pode criar varas federais especializadas por meio de resolução. Os ministros do Supremo Tribunal Federal definiram a questão, nesta quinta-feira, no julgamento de Habeas Corpus que pedia a declaração de inconstitucionalidade da criação das varas ou a anulação da transferência de um processo que tramitava em vara comum para uma vara especializada em lavagem de dinheiro.

 

A questão da validade da Resolução 314 do Conselho da Justiça Federal, que criou as varas especiais, foi debatida paralelamente ao pedido do HC por necessidade processual. Os ministros discutiam a legalidade da transferência de um processo já em andamento para a vara especializada. Mas não chegaram a definir a questão porque a relatora, ministra Cármen Lúcia, mudou seu entendimento anterior.

 

O caso discutido foi o do doleiro Roberto de Barros Leal Pinheiro, que respondia a processo na 12ª Vara Federal de Fortaleza. Com a especialização da 11ª Vara Federal, que passou a cuidar apenas de crimes financeiros, o processo foi transferido para lá. Pinheiro é acusado de crimes contra o sistema financeiro, contra a ordem tributária e apropriação indébita.

 

Uma declaração de inconstitucionalidade do Supremo teria um grave risco de ordem prática já que centenas de processos em situação semelhante poderiam voltar à vara de origem para serem refeitos, como o caso Banestado. No memorial que entregou à relatora meses antes, o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, chegou a alertar para "implicações dantescas" e "efeitos desastrosos" de uma decisão nesse sentido.

 

Invocando o princípio do juízo natural, o réu entrou com pedido HC no Supremo para o retorno do caso à vara originária, por considerar inconstitucional a especialização das varas por meio de resolução. Os advogados de Pinheiro alegavam a inconstitucionalidade da resolução do CJF e da Resolução 10-A/2003, do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que criaram as varas especializadas.

 

Quando o assunto foi julgado pela 1ª Turma do STF, a ministra Cármen Lúcia acolheu em parte o pedido da defesa. Segundo ela, a especialização das varas foi regular, mas a transferência dos processos em andamento, não. Foi seguida pelo ministro Ricardo Lewandowski. Por considerar a repercussão do caso, o ministro Marco Aurélio, presidente da Turma, propôs que o julgamento fosse levado a plenário. Os colegas concordaram.

 

 

Decisão repensada

 

No julgamento desta quinta-feira, com informações novas, a ministra mudou seu voto em relação ao caso. No primeiro voto, Cármen Lúcia entendeu não ter havido ofensa ao princípio do juiz natural e considerou a criação das varas especializadas perfeitamente constitucional. Mas, ressaltou que houve ofensa ao artigo 75 do Código de Processo Penal. "A precedência da distribuição fixará a competência quando, na mesma circunscrição judiciária, houver mais de um juiz igualmente competente", reza o dispositivo.

 

A ministra disse que esse princípio dá ao cidadão o "direito de ter segurança de saber quem vai julgar seu processo". Assim, a denúncia deveria ser julgada pela mesma vara para a qual o inquérito havia sido distribuído, antes do advento da resolução do TRF-5. Apesar do teor desse voto, alguns operadores interpretaram que a posição de Cármen Lúcia poderia justificar pedidos de anulação de decisões tomadas em varas especializadas.

 

No dia 11 de dezembro, depois de receber o memorial da PGR, Cármen Lúcia enviou um oficio para a 11ª Vara Federal de Fortaleza para esclarecer se a denúncia tinha sido realmente recebida por este juízo ou pela 12ª Vara. Pediu ainda documentos sobre o andamento processual. "Dentro dos documentos apresentados havia trechos ilegíveis, mas que agora estão esclarecidos", afirmou, ao justificar seu pedido.

 

No voto desta quinta, Cármen Lúcia viu que enquanto o processo estava nas mãos da primeira vara não houve providências que poderiam ser consideradas decisórias. "Não se tinha consumado o elemento decisório ou o recebimento da denúncia", argumentou a ministra. Ficou compreendido então que, quando estava na 12ª Vara, a Ação Penal era ainda um Inquérito que não tinha tido até procedimentos como quebra de sigilo ou indisponibilidade de bens. Por isso, a transferência do processo de uma vara para outra não feriu a devida distribuição. "O Poder Judiciário tem competência para dispor sobre especialização de varas", afirmou a relatora.

 

Apesar dessa decisão, o fundamento de seu primeiro voto foi mantido (Clique aqui para ler). A ministra foi acompanhada por 10 dos 11 ministros do Supremo. Apenas, Marco Aurélio foi divergente.

 

Na sessão desta quinta, o ministro Cezar Peluso ressaltou que a resolução do TRF nada mais fez que redistribuir competências entre órgãos já criados por lei. "É matéria de reorganização judiciária interna, prática extremamente usual nos tribunais", disse. O ministro afirmou que se a tese no HC fosse verdadeira, seria necessário "anular milhões de julgamentos". "Teríamos um efeito catastrófico perante a Justiça Federal", acrescentou.

 

O ministro Menezes Direito avaliou que, quando se trata de competência material, há possibilidade de determinar outro juiz competente. "Se nós fossemos acolher a tese do Habeas Corpus, iríamos gerar um transtorno extraordinário em toda a prestação jurisdicional do país".

 

"No caso dos autos, o que houve foi simples especialização", lembrou Carlos Ayres Britto. Ele concordou que o princípio constitucional da reserva de lei vale para a criação de varas e suas respectivas localizações.

 

Celso de Mello ressaltou que o princípio constitucional do juiz natural impede "designações casuísticas" de magistrados para julgar determinada causa. Para ele, a especialização de vara por meio de resolução não ofende o princípio do juiz natural e não transgride o postulado da reserva de lei.

 

"Ainda mais se se considerar que não se criou nova vara federal, ao contrário, especializou-se vara já existente. Não houve qualquer designação casuística em função de determinado réu, mas apenas adotou-se uma medida com o objetivo de permitir-se uma prestação mais célere da própria jurisdição", concluiu.

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