STF: réu só deve ser preso se condenado em última instância Do jornal O Globo 06/02/2009 - O Supremo Tribunal Federal abriu ontem uma brecha para que réus condenados possam continuar em liberdade mesmo depois de terem recebido, na segunda instância da Justiça, a pena de prisão. Por sete votos a quatro, a Corte estabeleceu que a pena só deve começar a ser cumprida quando não houver mais qualquer possibilidade de recurso a tribunais superiores, ou seja, quando o processo estiver julgado pela última instância. A decisão do STF também permite que todos os brasileiros que estão presos e não foram condenados em última instância possam recorrer à Justiça para ganhar a liberdade, com base no novo entendimento dos ministros. Fazendeiro beneficiado é acusado de homicídio No julgamento de ontem, o STF concedeu habeas corpus a um fazendeiro condenado a sete anos e meio de prisão, em segunda instância, por tentativa de homicídio duplamente qualificado. Ele alegou que sua prisão era ilegal até que a sentença fosse confirmada pela mais alta Corte de Justiça do país. O fazendeiro já estava em liberdade desde 2004, graças a uma liminar do ex-ministro do STF Nelson Jobim, hoje ministro da Defesa. A decisão de ontem altera a jurisprudência do Supremo e deve influenciar os futuros julgamentos do tribunal. O presidente do STF, Gilmar Mendes, disse que a mudança não impede que os réus sejam alvo de mandados de prisão temporária ou preventiva, nas circunstâncias permitidas por lei. Mas deixou claro que, agora, o direito de recorrer em liberdade passa a ser regra, e não exceção. A decisão alterou uma jurisprudência histórica do STF e provocou discussão em plenário. O embate mais acirrado começou quando o ministro Cezar Peluso citou uma indagação do jurista Cesare Beccaria: "O que ganha a humanidade com a condenação de um inocente?". Irritado, o ministro Joaquim Barbosa disse que a visão favorece a impunidade e permite que bandidos recorram indefinidamente, com o objetivo de adiar o início da pena. "Estamos criando um sistema penal de faz-de-conta. Se tivermos que aguardar todos os recursos, o processo jamais chegará ao fim", afirmou. Favorável a deixar os réus recorrerem em liberdade, Peluso reagiu com indignação: "Se isso fosse verdade, as prisões não estariam superlotadas". Não estaria saindo gente pelas janelas dos cárceres. Para Lewandowski, lentidão da Justiça não é justificativa O ministro Ricardo Lewandowski afirmou que a lentidão do Judiciário não justifica que réus sejam presos sem condenação definitiva. Ele chegou a dizer que os acusados não podem ficar sujeitos ao convívio com facções criminosas e doenças infecto-contagiosas antes que se esgotem todas as chances de recurso. Além de Barbosa, só três ministros defenderam a chamada execução provisória da pena: Carlos Alberto Direito, Cármen Lúcia e Ellen Gracie. "Aguardar que a prisão só ocorra após o trânsito em julgado é inconcebível, com todo o respeito. A vencer essa tese, nenhuma prisão seria feita no Brasil", protestou Ellen. "Temos criminosos confessos que são condenados em primeiro e segundo grau e não vão para a cadeia porque o volume de recursos não se esgota nunca", reforçou Direito.