20/11/2009 - 16:06

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Recursos provocam lentidão na Justiça, diz pesquisa

Recursos provocam lentidão na Justiça, diz pesquisa

 

 

Do Jornal do Commercio

 

20/11/2009 - A cada dez determinações proferidas diretamente pelo relator no segundo grau de Justiça, apenas 3,5 são impugnadas pelas partes por meio de agravos internos. É o que revela a pesquisa Decisão monocrática e agravo interno: celeridade ou entrave processual? realizada pela professora da Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Leslie Shérida Ferraz e divulgada na noite de quarta-feira, na sede da instituição, no Rio de Janeiro.

 

O estudo retrata somente a realidade do Tribunal de Justiça do Estado (TJ-RJ) e foi elaborado com base em estatísticas da corte fluminense e do Justiça em Números, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), disponíveis entre 2003 a 2008, com o objetivo de aferir o impacto das Leis 9.139/95 e 9.765/98, que ampliaram o poder do relator como forma de diminuir a carga de trabalho dos órgãos colegiados.

 

A professora explicou, em seu estudo, que o sistema recursal é apontado como um dos principais causadores da morosidade da Justiça. Inúmeras alterações têm sido realizadas para sanar o problema, entre os quais aquelas que criaram a súmula vinculante e a repercussão geral no recurso extraordinário, julgamentos por amostragem que reduziram as hipóteses de cabimento dos embargos. Nesse contexto, encontram-se as duas leis pesquisadas. Ambas tiveram como objeto o artigo 557 do Código de Processo Civil (CPC).

 

Pelo dispositivo original, o relator tinha autorização apenas para indeferir os recursos de agravo manifestadamente improcedentes. A lei, promulgada em 1995, alterou o artigo 557 permitindo ao relator negar seguimento a qualquer recurso manifestadamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou contrário à súmula do respectivo tribunal superior. A norma de 1998, por sua vez, além de manter as prerrogativas existentes, autorizou o relator a dar provimento a qualquer recurso, nos casos em que a decisão recorrida fosse contrária a súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal (STF) ou dos demais tribunais superiores. Isso quer dizer que o relator passou a julgar monocraticamente qualquer tipo de recurso, ao invés de submetê-lo à decisão colegiada.

 

O estudo atém-se a determinação monocrática proferida quando da análise de agravo de instrumento (interposto contra decisão interlocutória tomada pelo juiz no curso do processo) e de apelação (que visa à decisão final). A decisão monocrática pode ser impugnada pelas partes através do agravo interno. No entanto, segundo o estudo, são poucos aqueles que fazem uso de tal instrumento. O índice gira em torno de 35%. Esse percentual, entretanto, já foi menor: em 2005 era de 31% e em 2006, de 19,8%.

 

Podem haver duas explicações para isso: ou de fato a parte se conformou ou ela sabe que não haverá reversão no julgamento. Ou seja, ela sabe que, por mais que recorra, não haverá mudança no julgamento, explicou a professora. Todos os desembargadores do TJ-RJ afirmaram que o percentual de reforma das decisões é muito baixo, não supera 1%.

 

 

Desinteresse

 

Joaquim Falcão, diretor da Escola de Direito da FGV e ex-integrante do Conselho Nacional de Justiça, afirmou que o número indica que as próprias partes não estão interessadas em recorrer. Havia dogmas processualistas que nos faziam achar que a democracia ocorria com o acesso ao maior número possível de recursos. O estudo mostra que as próprias partes não querem mais recursos. Isso nos faz repensar (o sistema), afirmou, na divulgação do levantamento.

 

O juiz Roberto Ayoub, vice-presidente da Associação dos Magistrados do Estado do Rio e professor supervisor da Escola de Direito, defendeu a continuidade da pesquisa. Creio que isso merece um estudo mais aprofundado. Uma das críticas que se faz ao Judiciário é justamente a morosidade. Temos que saber como isso ocorre no Brasil. Se é verdade que apenas 35% recorrem e os demais 65% inviabilizam a subida das ações, com certeza teremos reflexo nos tribunais superiores, disse.

 

Leslie informou que levantamento semelhante ocorrerá no Judiciário de outros estados. Um dos tribunais interessados é o do Rio Grande do Sul. A professora concorda que a afirmação de que a mudança legislativa, apesar de pontual, terá reflexo na demanda das cortes superiores.

 

Não podemos pensar que decisões pontuais trazem consequências pontuais. Temos que ver a Justiça como um todo. Trata-se de um sistema. A partir do momento em que a decisão monocrática não é atacada, podemos ver, a médio e longo prazo, uma diminuição dos recursos especiais e extraordinários, afirmou.

 

 

TJ-RJ é um dos mais céleres do País

 

Estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV) indica que o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ) é um dos tribunais mais céleres do País. Segundo a pesquisa, em 2003, os desembargadores demoravam 158 dias para concluir um caso. Em 2008, a média era de 100 dias. Em abril deste ano, o número caiu ainda mais,para 87 dias.

 

Outro dado apontado na pesquisa foi o relativo aos gastos do tribunal. Embora as despesas do TJ-RJ tenham aumentado em números absolutos - de R$ 1,2 bilhão em 2003 para R$ 1,8 bilhão em 2008 -, sua relação com o Produto Interno Bruto (PIB) estadual sempre apresentou decréscimo, atingindo, em 2008, a marca de 0,55%, inferior à média nacional, de 0,66%. Neste ano, o TJ-RJ ocupou a quarta menor posição na relação entre despesas e PIB estadual.

 

Houve um aumento nas receitas decorrentes de custas e outros recolhimentos. Em 2008, o TJ-RJ ficou em 2º lugar no recebimento de custas e taxas judiciais, superado apenas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, e teve o melhor desempenho do País na relação entre receitas totais e despesas (29%, contra 17% da média nacional). (GS)

 

 

Reforma diminui tempo de julgamento

 

A celeridade foi uma das principais consequências da reforma do artigo 557 do Código de Processo Civil (CPC), aponta a pesquisa produzida por Leslie Shérida Ferraz, professora da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Segundo o estudo, em 2008, o tempo médio de julgamento de um acórdão no TJ-RJ foi de 128 dias para agravos e 51 dias para apelações. As decisões monocráticas, por sua vez, registraram média de 38,4 dias para agravos e 51 para apelações, para serem proferidas.

 

De acordo com a pesquisa, o Judiciário fluminense profere mais acórdãos do que decisões monocráticas. Em 2008, por exemplo, foram 97.626 decisões colegiadas e 64.359 individuais. No entanto, verifica-se uma tendência crescente de os magistrados optarem por julgar o processo monocraticamente. O índice de decisões monocráticas passou de 23,7% em 2003 para 39% no ano passado. O número de determinações colegiadas caiu proporcionalmente no mesmo período: de 76,3% para 60,3%.

 

A decisão diretamente do relator prevalece no julgamento de agravos de instrumento. Em 2008, 53,8% dos recursos tinham sido julgados individualmente. No que diz respeito à apreciação dos recursos de apelação, a preferência é pela decisão colegiada. Mesmo nesse tipo de recurso, entretanto, há tendência de aumento da monocrática, que hoje responde por um terço dos julgados. Nas entrevistas realizadas com desembargadores do TJ-RJ, apurou-se que o maior rigor na aplicação do artigo 557, do CPC, nos recursos de apelação justifica-se pelo fato de que, diversamente do agravo de instrumento, esta modalidade recursal encerra a controvérsia, conclui o estudo.

 

tempo. De acordo com a pesquisa, o tempo de julgamento da decisão monocrática é menor que o colegiado mesmo nos casos em que há impugnação. O tempo médio de decisão de agravo interno de agravo de instrumento foi, no ano passado, de 36,8 dias. A marca jamais passou de 45 dias, tendo variado entre 35,7 dias, em 2007, e 44,2 dias, em 2005. No que diz respeito à apelação, a média é de 31 dias.

 

Para a professora, em termos objetivos, o maior poder conferido ao relator representou uma saída para reduzir a morosidade. Vimos que uma decisão monocrática demora três vezes menos que uma decisão colegiada. O que temos que pensar, e que não dá para calcular empiricamente, é se, em termos de Estado Democrático de Direito, queremos uma decisão em segundo grau feita apenas por um julgador, ou se preferimos um tempo maior para que a decisão seja mais elaborada, discutida, pensada, disse.

 

Os advogados, por exemplo, alegam que quando há uma decisão monocrática, eles não sabem do julgamento, não podem fazer uma sustentação oral. Eles acreditam, então, que há um comprometimento das regras processuais. É isso que tem que ser pensado também. Os números não vão nos dizer isso. Temos que fazer outro tipo de estudo, acrescentou.

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