14/11/2008 - 16:06

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Punição de torturadores é defendida pelo ministro Vannuchi

Punição de torturadores é defendida pelo ministro Vannuchi


Da redação da Tribuna do Advogado

14/11/2008 - "Só as feridas lavadas cicatrizam", afirmou Paulo Vannuchi, secretário nacional de Direitos Humanos, lembrando frase da presidente do Chile, Michele Bachelet, a respeito da necessidade de se lançar a luz sobre os crimes contra os direitos humanos cometidos pela ditadura militar chilena, como condição para uma verdadeira reconciliação.

Para Vannuchi, que proferiu palestra nesta sexta, dia 14, sobre o tema O direito à memória e à verdade: dever do Estado, a frase de Bachelet cabe perfeitamente na situação brasileira. Segundo ele, "é preciso estar aberto à reconciliação, mas o que não se pode aceitar é uma reconciliação em cima da mentira".

Vannuchi contou que trabalha como assessor do presidente Luis Inácio Lula da Silva desde 1980 e que, quando em dezembro de 2005 Lula o convidou para assumir a Secretaria Nacional de Direitos Humanos, lhe disse abertamente não estar satisfeito com a situação em que estava o problema dos mortos e desaparecidos políticos.

O ministro admitiu que no governo federal há mais de um entendimento sobre a punição dos torturadores e assassinos de presos políticos, e que o debate segue em seu interior. Mas, disse ele, "não haverá uma verdadeira reconciliação nacional enquanto os fatos não vierem à luz".

E não se furtou a apontar as razões pelas quais discordou do parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), contrário à punição dos torturadores.

Em primeiro lugar, contestou a afirmação da AGU de que o Ministério Público de são Paulo não fosse competente para acionar os antigos torturadores, sob a fundamentação de que a questão não seria de interesse público. "Ora, a tortura não é questão dos torturados, mas da sociedade", disse.

Afirmou, ainda, que - ao contrário do que sustentou a AGU - a anistia de 1979 não poderia incorporar torturadores porque, mesmo as constituições de 1967 e 1969, outorgadas pelo regime militar, estabeleciam como dever do Estado a garantia da integridade física dos presos. Assim, frisou, mesmo na ditadura a tortura era ilegal.

O terceiro argumento levantado pelo AGU - o de que não existiriam mais arquivos da repressão política - tampouco se sustenta, segundo o ministro Vannuchi. A própria chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, estaria tratando dessa questão.
E concluiu: "Não haverá democracia brasileira consistente enquanto formos atraídos por essa deturpação de que estamos abrindo feridas".

Antes de Vannuchi tinha usado a palavra o jurista e ex-deputado federal Hélio Bicudo, cujo tema era correlato: Possibilidade jurídica de responsabilidade penal e imprescritibilidade dos crimes da ditadura. Bicudo defendeu posições semelhantes às que, em seguida, o secretário nacional de Direitos Humanos defenderia. E lembrou: "Se esta polêmica sobre a punição dos torturadores sempre retorna é porque ela é relevante".

Numa autêntica aula de Direito, Bicudo demonstrou que não se pode considerar a tortura um crime conexo aos crimes políticos. "É preciso que os crimes conexos tenham o mesmo fim", ensinou. E exemplificou: "Se Fulano comete um homicídio e, depois, é morto pela polícia, não há crimes conexos, mas dois crimes independentes".

Ao final de sua intervenção, sob aplausos da platéia, fez duas afirmações, que apresentou como propostas à Conferência:

a) A Lei da Anistia não alcança agentes do Estado que cometeram crimes.
b) Os crimes de tortura são imprescritíveis.

A ministra Carmen Lúcia Rocha, do Supremo Tribunal Federal (STF), falou depois sobre Participação direta na democracia brasileira, mas não se furtou a elogiar as intervenções anteriores sobre punir-se ou não os torturadores. "Aproveitei muito e vou levar em conta esse debate, quando tiver que analisar a questão no Supremo".

Mas - numa posição que contrasta com a adotada pelo presidente do STF, Gilmar Mendes - disse que, no encontro, não entraria no mérito, porque jamais antecipa seus votos.

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