18/02/2008 - 16:06

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Projeto de Eduardo Suplicy propõe férias menores na magistratura

Projeto de Eduardo Suplicy propõe férias menores na magistratura

 

 

Do Jornal do Commercio

 

18/02/2008 - Em meio à divulgação de estudos que comprovam o excessivo volume de novos processos que, no ano passado, chegaram aos tribunais de todo o País, tramita no Congresso mais uma proposição que visa a solucionar a tão criticada morosidade da Justiça brasileira. Esta, porém, diferentemente das demais, causa mal-estar entre os membros do Judiciário porque propõe o fim do que muitos podem considerar regalia: as férias de 60 dias por ano a que a magistratura tem direito. De autoria do senador Eduardo Suplicy (PT-SP), o Projeto de Lei 374/2007 relaciona os dois meses de descanso à demora processual, mas juízes discordam e justificam a importância das férias em dobro.

 

No projeto, o senador diz que a morosidade nos trabalhos forenses deve-se aos poucos dias úteis de trabalho, tanto dos magistrados como dos servidores, que usufruem todos os feriados. Suplicy afirma que, além dos períodos regulares, juízes e servidores da Justiça têm 17 dias sem trabalho, de 20 de dezembro a 6 de janeiro, cinco dias de quarta-feira ao domingo de Páscoa, cinco dias de sábado e quarta-feira de carnaval, além dos dias 1º e 2 de novembro e os dias do Advogado, do Servidor Público e da Justiça. A esse cálculo, adiciona os finais de semana e seis feriados nacionais - 21 de abril, 1º de maio, Corpus Christi, 7 de setembro, 12 de outubro e 15 de novembro.

 

O projeto do senador altera o artigo 66 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman). Pela redação, os juízes e membros dos tribunais terão direito a férias de 30 dias por ano.

 

 

Discordância

 

O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Walter Nunes, por exemplo, argumentou que a estatística apresentada pelo senador é equivocada e apresenta apenas uma parte da questão. Na avaliação dele, o trabalho da magistratura não pode ser mensurado pela quantidade de horas que o magistrado passa no gabinete.

 

"Um juiz não trabalha na resolução de uma causa tão somente quando está em seu gabinete. Ele tem que estudar, e não apenas Direito. As causas analisadas na Justiça Federal, por exemplo, tratam de questões macro. No gabinete, às vezes, o juiz não tem tempo, porque toda a hora está a receber as partes", disse.

 

De acordo com Nunes, o problema da morosidade passa pela carga de trabalho dos magistrados, que é excessiva e, por essa razão, demonstra a falta de quadros suficientes para atender a toda demanda processual. "Outra problemática são as inúmeras possibilidades que as partes têm de recorrer e, assim, adiar a efetivação da determinação judicial. A decisão de primeira instância não pode ser um nada jurídico. Tem que ter uma conseqüência", criticou o magistrado.

 

O presidente da Ajufe destacou que, apesar das deficiências, a Justiça brasileira tem dado retorno às demandas que chegam. De acordo com ele, dados de 2006 indicavam que cada ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), por exemplo, julgava, em média, dez processos por dia; os do Superior Tribunal de Justiça (STJ), oito. "A despeito disso, há as decisões em pedidos de liminar", acrescentou Nunes, "para quem uma das formas de se combater a morosidade é promover uma efetiva reforma processual e realizar investimentos em informatização".

 

Nunes comenta que as férias de 60 dias foram discutidas no Fórum Nacional dos Juizados Especiais Federais, evento promovido pela entidade no ano passado. "Na ocasião, especialistas concluíram que o período é necessário devido à excessiva carga emocional que a função de decidir acarreta. Há estudos nesse sentido. Essas férias são importantes. É preciso haver um intervalo na atividade tendo em vista a carga emocional que ela traz. Afinal, queremos um juiz equilibrado", disse.

 

O vice-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Cláudio DellOrto, também tem posição contrária ao projeto. Segundo afirmou, as férias dobradas se justificam, entre outras razões, pela extensa carga horária de trabalho cumprida pela magistratura. "O juiz tem atribuições que ultrapassam seu expediente. O período de férias, então, se deve à carga horária maior, disse, destacando que, em muitos casos, os juízes utilizam parte do período para pôr os processos em ordem".

 

Para o magistrado, reduzir as férias pode agravar o deficiente quadro da magistratura, "porque muitas pessoas, exauridas, poderão afastar-se por motivos de saúde", disse.

 

"A morosidade não decorre das férias, advém do sistema processual, que estimula o litígio e o direito não se materializa. Além disso, há o volume excessivo de processos e a deficiência no quadro de juízes para executar as sentenças", disse ainda.

 

Segundo o vice-presidente da AMB, o projeto de lei que prevê a redução do período de férias dos magistrados contém vício de iniciativa. Segundo afirmou, a proposta jamais poderia ser feita pelo Legislativo.

 

 

5,7 milhões de novos processos

 

Estatísticas dos tribunais mostram que é crescente o volume de processos. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), por exemplo, divulgou que somente a primeira instância recebeu, no ano passado, mais de 5,7 milhões de novos processos em todo o Estado. Desses, mais de 2,1 milhões são da área cível, 1 milhão na área criminal, 222 mil da Infância e Juventude. No mesmo período, os juízes registraram 3,6 milhões de sentenças e realizaram mais de 1,5 milhão de audiências.

 

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) também registrou volume considerável de ações. A Justiça Estadual julgou, ao longo do ano passado, 1.178.972 processos - o que eqüivale a 93% dos 1.275.952 processos recebidos. Na 1ª instância, foram distribuídas 1.137.365 novas ações e julgadas 1.033.935. Na 2ª instância, foram 138.587 processos distribuídos e 145.037 julgados - 73,7% a mais do que em 2003. Apesar disso, a corte conseguiu reduzir o tempo de julgamento dos recursos para 103 dias, número 27,5% inferior ao registrado quatro anos antes.

 

Pesquisa divulgada do Banco Mundial, em dezembro do ano passado, indica que o número de ações que chegam ao Judiciário brasileiro está acima da média, quando comparado ao dos demais países da América Latina, mas a produção dos juízes faz desse Poder exemplo na região. A carga de trabalho apreciada por alguns tribunais está acima da média internacional.

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