24/07/2024 - 18:38 | última atualização em 25/07/2024 - 12:09

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‘Pretas da Cevenb’: nova edição de seminário homenageia mulheres negras com comenda em alusão a Esperança Garcia

Biah Santiago



Com gancho no Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha (celebrado no dia 25 de julho), a Comissão Estadual da Verdade da Escravidão Negra no Brasil (Cevenb) da OABRJ realizou, na tarde desta quarta-feira, dia 24, mais uma edição do seminário da iniciativa "Pretas da Cevenb", que incentiva a participação de mulheres negras em espaços representativos da sociedade para que desempenhem o papel de peça central na construção do debate sobre a reparação da escravidão.

Para assistir ao evento na íntegra, basta acessar o canal da Seccional no YouTube.

O presidente e a vice da comissão, Humberto Adami e Alessandra Santos, ficaram encarregados da gestão do evento. Também participaram o desembargador e presidente do Comitê de Promoção da Igualdade de Gênero e de Prevenção e Enfrentamento dos Assédios Moral e Sexual e da Discriminação (Cogen) do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), Wagner Cinelli; a presidente da Academia Carioca de Direito e ex-presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), Rita Cortez; a professora do Departamento de Letras da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Ligia Ferreira; a jornalista da TV Globo Victória Henrique; e o ator Deo Garcez, que há dez anos, interpreta no teatro o advogado abolicionista, jornalista e escritor brasileiro Luiz Gama.

Adami anunciou que a Cevenb da OABRJ e a Escola Superior do IAB (ESIAB) promoverão um curso virtual com cinco aulas, a partir do dia 6 de agosto, sobre aspectos jurídicos da reparação da escravidão. Saiba como se inscrever no site do IAB.

“Quantos relatos, neste e nos seminários anteriores, tivemos de mulheres que vêm contar sua própria história... Isso já é um dos motes para a reparação da escravidão. Pensando em ampliar o acesso sobre a pauta, construímos, em parceria com o IAB, um curso para tratar dos fundamentos jurídicos da reparação da escravidão”.

A vice-presidente da comissão relembrou as edições anteriores do projeto e destacou a importância de se promover a pauta racial nas instituições.

“Já passaram pelas quatro edições do seminário mais de 200 mulheres negras, que tiveram visibilidade, tiveram vez e voz. Ir sozinha, ser preto único no topo não tem a menor graça. O que importa é termos várias de nós aqui ocupando este espaço, ver caras pretas nos retratos da parede principal”, afirmou Alessandra.

O seminário também se prestou a homenagear centenas de mulheres cuja atuação coloca em diálogo a reparação da escravidão, os direitos humanos e a igualdade racial na sociedade com uma moção de agradecimento em alusão a Esperança Garcia (mulher preta escravizada, reconhecida pelo Conselho Federal como a primeira advogada do Brasil). Um dos momentos mais emocionantes do dia foi a leitura, pela atriz Soraia Arnoni, da carta na qual Esperança Garcia descreve a tortura sofrida durante os anos como escrava. O documento histórico é considerado pelo Conselho Federal a primeira petição elaborada por uma mulher. 

“Sinto-me honrada em receber essa homenagem da OABRJ. Como jornalista, entendo que o jornalismo é uma ferramenta de transformação social, na qual fui forjada nos movimentos antirracistas, na comunicação comunitária e independente”, afirmou a jornalista da TV Globo Victória Henrique, uma das agraciadas com a comenda.

“No jornalismo, há uma questão, que provoca um debate intenso, sobre sermos objetivos e neutros. Mas, quando você é uma pessoa, uma jornalista negra, não dá para desconsiderar as suas subjetividades e escrever ou cobrir uma matéria sem olhar para as suas vivências como pessoa negra. Se hoje sou uma jornalista com um olhar sensível, foi porque tive trajetórias em veículos que tinham a pauta racial como princípio”.

Uma das homenageadas, a presidente da Cevenb da OAB/Barra da Tijuca, Elizabeth Baraúna, destacou a carga extra de discriminação a qual mulheres pretas carregam por terem que lidar com as dores e obstáculos provocados pelo racismo e pelo machismo.

“Existe um termo chamado dororidade, criado pela escritora Vilma Piedade, que significa a dor que só nós mulheres pretas sabemos e conhecemos, porque antes de chegarmos com o gênero, chegamos com a nossa cor”, ponderou Baraúna.

“O ‘Julho das Pretas’ simboliza a base da nossa sociedade, que é formada, em sua maioria, 56%, por negros, pretos e pardos. Dinheiro não tem cor, então, quando lembrarmos que ele também pode estar nas mãos de pessoas pretas, acredito que a nossa visibilidade saia dos meses de julho e novembro apenas, porque somos pretos o ano todo”.

A advogada Elisabete Santos declarou: “Nós, pessoas pretas, não tínhamos a oportunidade de ocupar os espaços dominados por pessoas brancas, de falar nesta tribuna. É um orgulho poder continuar o legado de Esperança Garcia, pois cada uma de nós carrega a voz dela, e continuamos propagando a indignação dessa mulher preta diante dos anos da escravidão”.

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