18/03/2009 - 16:06

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Pressão de governantes derruba relator dos precatórios

Pressão de governantes derruba relator dos precatórios


Do Valor Econômico

18/03/2009 - A pressão de governadores e prefeitos por mudanças nas regras de pagamento de precatórios, previstas na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 12 de 2006, em tramitação no Senado, levou à renúncia do relator, Valdir Raupp (PMDB-RO), que será substituído pela senadora Kátia Abreu (DEM-TO). Ontem à noite, após um dia de muitas conversas com senadores e com representantes de Estados e municípios, Raupp afirmou ao Valor que decidiu abrir mão do cargo, atendendo a apelos da própria Kátia e do presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Demóstenes Torres (DEM-GO). Essa mudança poderá facilitar a mudança de itens da PEC para atender aos interesses dos governos locais, dificultando o pagamento da dívida judicial de Estados e municípios, estimada em cerca de R$ 100 bilhões.

O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), encabeça movimento de prefeitos de todo o país para mudar as regras do regime especial de pagamento de precatórios, previstas no texto atual da PEC. As reivindicações estão contempladas em uma emenda assinada por vários senadores, tendo à frente o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM).

Kassab, acompanhado de um grupo de prefeitos, foi ontem ao Senado discutir o assunto. Ele esteve com a nova relatora, Kátia Abreu, com Raupp, e também teve uma audiência com o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). "Viemos pedir ao presidente Demóstenes que faça o maior esforço para que o projeto seja votado. Os municípios têm grande interesse. Precisamos ter um desfecho rapidamente, a favor ou contra o que os prefeitos defendem", afirmou Gilberto Kassab.

São Paulo tem uma dívida em precatórios de R$ 11,5 bilhões. Segundo a assessoria do prefeito, se o parecer de Raupp à PEC for aprovado, a projeção é que haja um deságio de 60%, caindo para R$ 5 bilhões. Pelas regras previstas no texto atual, eles seriam pagos em 18 anos. "Esse valor de R$ 5 bilhões é um número significativo, até porque, quando não tem folga orçamentária, a qualquer momento um sequestro dos recursos da prefeitura pode interromper o gerenciamento do orçamento", disse Kassab. Ele defende que os municípios fiquem livres do risco de sequestro, em caso de não cumprimento do pagamento de precatórios.

O presidente da Frente Nacional de Prefeitos, João Paulo, ex-prefeito de Recife (PT), participou da reunião com Kátia Abreu. Ele admite que o parecer de Raupp não atende aos prefeitos. "Defendemos que seja estipulado um percentual da receita líquida, que varia entre 0,6 a 1%", disse. Segundo ele, os municípios estão vivendo uma situação muito difícil, especialmente com a crise econômica. "Há uma queda na arrecadação e, ainda por cima, tem os sequestros dos recursos das prefeituras", afirmou João Paulo.

A principal alteração proposta pelo substitutivo de Arthur Virgílio é a redução do comprometimento financeiro dos Estados e municípios com o pagamento de precatórios. Na versão atual, proposta por Valdir Raupp, o poder público precisa destinar de 0,6% a 1,5% da sua receita com o pagamento dos precatórios, no caso de prefeituras, e até 2%, no caso de Estados. Mas o percentual é progressivo, dependendo da proporção do endividamento de cada um. O substitutivo defendido pelo DEM eleva a tolerância do projeto, o que deve deixar alguns governos em faixas mais brandas de vinculação. Uma dívida de precatórios equivalente a até 20% da receita líquida leva uma prefeitura a ficar na faixa de 1% de vinculação e um Estado na faixa de 1,5%, no texto atual. Pelo novo substitutivo, a proporção passa para 35% da receita líquida. O projeto também aumenta de 50% para 60% o volume de receitas que serão destinados a um sistema de leilões públicos pelo qual o governo compra de volta os precatórios vencidos com desconto - e assim reduz mais rapidamente o estoque de dívida.

Único grupo organizado que se opõe ativamente à aprovação da proposta de emenda constitucional 12, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) divulgou ontem uma nota repudiando a falta de apoio à proposta endossada pela entidade, um substitutivo do senador Renato Casagrande (PSB-ES) pelo qual precatórios vencidos virariam títulos de dívida com liquidez, podendo ser negociados e usados para quitar tributos ou outras obrigações com o poder público. O vice-presidente da Ordem, Vladimir Rossi, criticou a falta de abertura a diálogo dos prefeitos e governadores que não aceitam mudanças no texto da PEC para acomodar interesses dos credores.

Do total da dívida do poder público com precatórios, até 20% corresponde a honorários advocatícios, o que explica o interesse da categoria pelo projeto. Segundo presidente da comissão de precatórios da OAB de São Paulo, Flávio Brando, o desafio da entidade agora é reunir mais apoio para impedir a aprovação do projeto defendido pelos governos locais. Empreiteiras, grandes empresas, ruralistas e servidores públicos costumam ser credores de precatórios, e segundo Brando, poderiam sair a público para ajudar os advogados. "Não basta os credores nos apoiarem nos bastidores. Eles precisam botar a cara pra bater", diz.

No início da tramitação da PEC, em 2006, a Fiesp chegou a mobilizar algum esforço contra a proposta, saindo em socorro a empreiteiras paulistas, mas desde então pouco mais aconteceu. Uma nova esperança, diz o representante da OAB paulista, é que a nova candidata a relatora da PEC, Kátia Abreu, é uma das principais representantes da bancada ruralista na casa, e proprietários rurais são comumente credores de precatórios originados de ações de desapropriação.

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