28/08/2018 - 15:28 | última atualização em 28/08/2018 - 16:10

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Em pauta, feminicídio é visto como reflexo do machismo nas relações

redação da Tribuna do Advogado

          Foto: Lula Aparício  |   Clique para ampliar
 
Nádia Mendes
O Brasil é o quinto país no mundo no ranking de homicídios de mulheres. O Mapa da Violência de 2015 revela que 50,3% das mortes violentas são cometidas por familiares e 33,2% por parceiros ou ex-parceiros. Recentemente, as imagens da advogada Tatiane Spitzner sendo agredida por seu marido no elevador do prédio onde morava, no Paraná, chocaram o país e escancararam o problema, que vai muito além das ditas quatro paredes, reforçando cada vez mais a necessidade de se ‘meter a colher’.

“É todo um processo de omissão e tolerância que não é só do Estado, é também da sociedade. E o que a gente observa é um crescente desses crimes, principalmente nas grandes capitais”, reforça a juíza do 1º Juizado de Violência Doméstica da Capital, Adriana Ramos de Mello, a convidada da 36ª edição da Jornada Jurídica, evento que está sendo realizado em todo o estado para debater temas atuais, organizado pelo Centro de Documentação e Pesquisa (CPD) da OAB/RJ. O encontro, desta vez, aconteceu na sede da Seccional, na manhã desta terça-feira, dia 28.
Foto: Lula Aparício |   Clique para ampliar

A desigualdade de poder nas relações domésticas e familiares é um dos pilares do patriarcado, relação hierarquizada de poder onde a mulher sempre fica em um estado de opressão e de subalternidade em relação ao homem. “Ele não é de agora ou da década de 70. Essa desigualdade tem séculos ou até milênios. Não existe na história documentado que em um dado momento a gente tenha vivido um matriarcado”, disse Mello, reforçando que a violência sexista ocorre justamente em função dessas relações hierarquizadas.

“O feminicídio poderia ser uma morte evitável. O emprego da violência reforça um caráter de desprezo pela mulher e pelos papéis sociais que a ela são atribuídos. Geralmente se coloca a mulher em um papel social doméstico e privado. Toda vez que essa mulher rompe com essa relação patriarcal e abusiva é quando, em grande medida, acontece a violência contra ela e, não raras vezes, o feminicídio”, explicou Mello.
 
A juíza relatou que em grande parte dos processos judiciais em que as mulheres morreram pelas mãos de seus parceiros íntimos, atuais ou anteriores, consta a frase ‘não será minha, não será de mais ninguém’. “Estes homens não aceitam o rompimento dessa relação de desigualdade”, disse.

Diretora de Igualdade Racial da OAB/RJ, Ivone Caetano pontuou a importância da tipificação do crime de feminicídio. “Ouvimos ainda hoje que seria um exagero aumentar as penas pelo crime de homicídio praticado contra a mulher e que não haveria diferença em matar um homem ou uma mulher. Pessoas que assim se pronunciam ignoram os marcadores que as mulheres carregam sobre seus ombros, ignoram a vulnerabilidade do gênero, que é fruto do machismo, do patriarcado instituído no Brasil”, defendeu Caetano, que considerou o patriarcado como o alicerce da sociedade contemporânea.
 
“Trata-se de uma autoridade imposta ao homem institucionalmente, que o coloca acima da mulher no ambiente familiar e em todas as outras organizações sociais. Devemos combater a violência doméstica contra as mulheres desde o seu nascedouro, orientando e amparado aquelas que são consideradas, erroneamente, sexo frágil”, concluiu.

Para a secretária-geral da OAB Mulher, Alessandra Santos, o feminicídio pode ser considerado, de maneira geral, como uma forma extrema de misoginia, ou seja, o ódio e repulsa pelas mulheres ou por tudo que seja ligado ao feminino. Ela exaltou a Lei nº 13.104/2015, que tornou o assassinato de mulheres pela sua condição de gênero uma qualificação do homicídio, além de torná-lo crime hediondo. “A violência baseada no gênero é um problema social e se conecta com outras violações de direitos que afetam o desenvolvimento livre e saudável de todas as mulheres”, disse.

A coordenadora do Grupo de Trabalho (GT) de Enfrentamento à Violência Contra a Mulher da OAB Mulher, Rebeca Servaes, pontuou o quanto é relevante tratar desse tema. “Na verdade, não estão acontecendo mais casos de feminicídio. As pessoas que estão tendo cada vez mais consciência de que a violência de gênero acontece. Nosso papel aqui é discutir isso”.  A desembargadora da 21ª Câmara Cível do TJRJ, Regina Lúcia Passos, também participou do debate, bem como o diretor do CPD, Aderson Bussinger, e o presidente da Subseção de Petrópolis, Marcelo Schaefer.

A palestra está disponível na íntegra no canal da OAB/RJ no YouTube.
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