28/10/2022 - 17:49 | última atualização em 01/11/2022 - 18:20

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OAB Mulher discute desafios no combate à violência doméstica

Evento contou com profissionais de diversas áreas e abordou mecanismos como a Lei Maria da Penha

Felipe Benjamin



Realizado pela Comissão OAB Mulher na tarde de sexta-feira, dia 28, o evento "Desafios das mulheres no enfrentamento à violência doméstica" levou a questão ao Salão Nobre  Antônio Modesto da Silveira, na sede da Seccional. O encontro, recheado de intensos debates, teve o comando da presidente da OAB Mulher, Flávia Ribeiro, que defendeu a atuação das entidades do sistema de Justiça no combate à violência doméstica:

"Sei que os avanços no combate à violência contra a mulher no Brasil são ínfimos, mas eles existem. As pesquisas mostram um cenário grave, mas temos o papel da Defensoria Pública, do Ministério Público, da Patrulha Maria da Penha e da OABRJ, que vêm trabalhando para melhorar essa questão. É importante encarar a violência psicológica como uma lesão e precisamos ter um olhar diferenciado sobre essa questão, além de rever gargalos causados pela Lei Maria da Penha".


Além de Flávia Ribeiro, compuseram a primeira mesa do evento a psicóloga Artenira da Silva e Silva; a defensora pública e coordenadora do Núcleo Especial de Defesa dos Direitos da Mulher (Nudem), Matilde Alonso; o desembargador do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), André Fontes; a juíza federal e presidente da Comissão de Acessibilidade e Inclusão do TRF2, Cláudia Valéria Fernandes, e a procuradora de Justiça e coordenadora do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (CAO) do Ministério Público do Rio, Carla Araújo.

"Meu objetivo hoje aqui é demonstrar a percepção de todas as instituições do sistema de Justiça em relação à ineficácia da Lei Maria da Penha no país e à ineficácia da lei sob o ponto de vista das vítimas e de seus agressores", afirmou a psicóloga Artenira da Silva e Silva, primeira palestrante do evento.

"A Lei de Feminicídio é de 2015, a Lei Maria da Penha já tem 16 anos, o Estatuto da Criança e do Adolescente já está na meia-idade, e nenhuma das três normativas são operacionalizáveis no nosso país. Precisamos entender o porquê. Em todos os tribunais brasileiros, o número de prescrições supera o número de condenações, inclusive as prescrições pós-sentença condenatória", afirmou a psicóloga.

Falando sobre um caso em que foi vítima de violência, a juíza Cláudia Valéria destacou a importância do combate à impunidade no enfrentamento à violência contra a mulher.

"Sabemos que o nosso sistema não é perfeito", afirmou Cláudia Valéria. "É evidente que em todos os sistemas há profissionais bons e ruins, mas a maior violência que sofri foi dentro do sistema. Por ser magistrada, muitas pessoas afirmaram que eu só estava fazendo a denúncia por ser juíza e ter contatos".

Objeto de várias discussões durante o evento, a Lei Maria da Penha foi defendida pela coordenadora do Nudem.

"O Nudem do Rio de Janeiro está fazendo 25 anos este ano", afirmou Matilde. "Vivemos numa sociedade ainda extremamente machista, desigual e discriminatória, além de ser extremamente violenta com as mulheres. Essa é uma realidade que nos desafia todos os dias, e o principal desafio é convocar a sociedade para mudar essa cultura e não normalizar a violência. A Lei Maria da Penha é totalmente aplicada? Não, mas ela está ali, ela é necessária, e temos que lutar para que ela seja eficaz. Ela fortalece a rede de enfrentamento e atendimento, e coloca as instituições para trabalhar de forma articulada".


Juntando-se à mesa durante a cerimônia, o desembargador André Fontes pediu medidas sólidas para reverter o cenário de violência doméstica que assola a sociedade brasileira.

"Ou tomamos soluções concretas, ou eu continuarei certamente a ouvir relatos de violência doméstica ao longo dos anos", afirmou o desembargador.

"Nós criamos, recentemente, uma política pública na Lei de Licitações, dizendo que as mulheres vítimas de violência doméstica serão admitidas em microempresas que celebrarem contratos administrativos, o que foi um grande passo já que muitas dessas mulheres ficam em casa e não têm renda. Sou favorável à chamada forma dialogada da discussão porque não é possível que casais visitem uma delegacia vinte ou cinquenta vezes ao longo dos anos. A família merece ser tratada por um Código de Família, como acontece na Polônia, ou uma Justiça de Família, como há na Alemanha. É preciso que haja um sistema diferenciado, que não permita, por exemplo, que pessoas voltem a conviver dentro de um quadro de violência. Não é possível que achemos normal que uma mulher retorne para o lado de seu agressor repetidas vezes. As delegacias de Mulheres e a Lei Maria da Penha foram grandes avanços. A solução criminal precisa ser mais efetiva".

O evento contou, ainda, com uma segunda mesa formada por pela subsecretária de Política para as Mulheres do Estado do Rio de Janeiro, Soraya Cavalcanti; pelo diretor de sistemas da Polícia Militar do Rio de Janeiro, Major Ferreira; pela delegada da  Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam), Fernanda Fernandes, e pelo Cabo Silva, representante da Patrulha Maria da Penha, programa da Polícia Militar de enfrentamento à violência contra a mulher criado em 2019.

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