24/01/2009 - 16:06

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Justiça define união homossexual

Justiça define união homossexual

 

 

Do Jornal do Brasil

 

24/01/2009 - Pela primeira vez em sua história, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) julgará, na próxima semana, um processo sobre reconhecimento de união homoafetiva estável. A ação, que corre em segredo de justiça, foi movida pelo ex-companheiro de um militar que faleceu em 2006, vítima de HIV. O militar recebeu uma indenização por ter contraído o vírus enquanto ainda estava no Exército. No processo, o ex-companheiro disputa com a filha do militar o direito à pensão por morte concedida pelo Exército. Em julho do ano passado, a juíza Luciana Maria Pimentel reconheceu a união homoafetiva estável entre os dois, mas o advogado da filha, que figura como ré na ação, recorreu da sentença. A juíza baseou sua decisão em depoimentos de pessoas que conviveram com o falecido. A ré, por sua vez, alega que os encontros do pai e seu parceiro eram casuais.

 

Brigas pelo reconhecimento de novas entidades familiares baseadas em relação de afeto não são novas na Justiça brasileira, mas decisões que reconhecem a homoafetividade estável ainda são raras no país. Pioneiro nessa jurisprudência, o estado do Rio Grande do Sul começou, a partir de 2001, a permitir a tramitação deste tipo de processo na Vara da Família. Até então, ações movidas por homossexuais pela partilha de bens ao final da relação ou pelo direito ao patrimônio ou a pensão depois da morte de uma parceiro eram tratadas, exclusivamente, na Vara Civil, e como sociedade de fato.

 

"A nova jurisprudência é uma mudança significativa porque trata de inclusão", afirma a advogada especializada em direito homoafetivo, Maria Berenice Dias. "Mesmo que a Constituição não faça menção expressa a união homoafetiva como entidade familiar, o juiz deve decidir por analogia. O que não dá é para extinguir a ação por impossibilidade jurídica do pedido".

 

O advogado José Adilson Barbosa, que defende a filha do militar no processo a ser julgado na próxima semana, discorda: "Se o legislador quisesse, já teria feito essa modificação na reforma do Código Civil em 2003. Não o fez porque a sociedade não está preparada. E a lei não deve atender a minoria, mas a coletividade".

 

Adilson acredita que o TJ-DF mudará a decisão de primeira instância que reconheceu a união homoafetiva estável. Mas acredita, também, que o caso chegará ao Supremo Tribunal Federal (STF) por se tratar de uma matéria constitucional.

 

Em 2008, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a possibilidade jurídica de discutir ação sobre união homoafetiva no âmbito do Direito de Família. Os ministros não julgaram a procedência ou improcedência da ação - ou seja, não discutiram a legalidade ou não da união estável entre homossexuais -, mas a possibilidade jurídica do pedido.

 

 

Extensão de benefícios

 

O Supremo deve decidir, nos próximos meses, a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, proposta pelo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, em março de 2008, que pede ao Supremo a aplicação do regime jurídico das uniões estáveis, previsto no artigo 1.723 do Código Civil, às uniões homoafetivas de funcionários públicos civis do estado.

 

O advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli, já deu parecer sobre ADPF 132. "Apesar da Constituição não tratar expressamente das uniões homoafetivas no capítulo que dedica à família, a evolução e a complexidade das relações humanas estão a exigir do sistema jurídico respostas adequadas para a resolução dessas controvérsias, intimamente ligadas ao pleno exercício dos direitos humanos fundamentais", afirmou Toffoli em seu parecer.

 

 

Extensão de benefício já é senso comum em empresas

 

Estender os benefícios trabalhistas ao parceiro de mesmo sexo já faz parte da cultura de algumas empresas públicas e privadas. A Caixa Econômica Federal foi o primeiro banco público a validar a extensão dos benefícios. A única exigência é que se comprove legalmente que a união é estável. Entre os benefícios concedidos belo banco estão o plano de saúde para companheiro do mesmo sexo e os filhos, licença saúde para acompanhar cônjuge, transferência para outra cidade em função do cônjuge, licença em caso de nascimento ou adoção de filho pelo companheiro e licença em caso de morte dos sogros. Em 2005, quando a empresa adotou essa política, a estimativa era que 10% dos funcionários que tivessem relacionamento estável fossem homossexuais. O quadro de funcionários conta com 80 mil pessoas.

 

"A extensão dos benefícios faz parte da política de valorização da pessoa que começamos a desenvolver em 2004", afirmou Jetter Ribeiro de Souza, consultor de Recursos Humanos da Caixa. "Até o momento, cerca de 200 funcionários já pediram a extensão. Acreditamos que muitos outros ainda vão pedir. Mas, desde o início, sabíamos que a adesão seria lenta porque nem todos estão preparados para declarar sua orientação sexual. Os pedidos vão aumentar a medida que houver uma mudança cultural na sociedade".

 

Para Maria Berenice, desembargadora aposentada do TJ-RS, essa mudança cultural pode acontecer logo devido a mobilização dos movimentos sociais:

 

"A justiça levou 70 anos para reconhecer a existência de famílias extra-matrimoniais. Hoje temos famílias de mãe e filhos, só de irmãos e é reconhecida a união estável de um homem e uma mulher mesmo sem casamento oficial. A luta pelo reconhecimento da união homoafetiva deve ser mais rápida".

 

O Banco do Brasil e o Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES) também já estendem os convênios de saúde dos funcionários ao parceiro do mesmo sexo. Em todos os ministérios a extensão passou a ser regra por meio da Portaria 1.983/2006.

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