10/11/2007 - 16:06

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Juiz manda prender de novo 43 PMs acusados de tráfico

Juiz manda prender de novo 43 PMs acusados de tráfico

 

 

Do Jornal O Globo 

 

10/11/2007 - A liberdade dos 43 policiais do 15º BPM (Duque de Caxias) suspeitos de envolvimento com o tráfico durou menos de três dias. A Justiça recebeu na tarde de ontem nova denúncia do Ministério Público estadual, que incluiu mais um policial entre os acusados, e decretou a prisão preventiva do grupo. Nenhum deles tinha sido detido até o fim da noite.

 

Presos desde setembro, os 43 PMs haviam sido libertados na noite de terça-feira, porque o juiz Paulo Cesar Vieira de Carvalho Filho, do 1º Juizado Especial Criminal de Caxias, que acumula a 1ª Vara Criminal, rejeitou a denúncia do MP. O magistrado entendeu que ela não especificava a conduta de cada suspeito. O mesmo juiz decretou a prisão dos policiais.

 

Ao longo da quinta-feira, um grupo de seis promotores formulou nova acusação, dessa vez atendendo ao disposto no artigo 41 do Código de Processo Penal, que prevê a exposição do crime com todas as suas circunstâncias. O 44º PM incluído na nova denúncia já vinha sendo investigado.

 

A comemoração da libertação dos policiais, na noite de terça-feira, provocou indignação em autoridades. Os PMs, quando deixaram o Batalhão Especial Prisional, em Benfica, soltaram até fogos de artifício. O governador Sérgio Cabral chegou a dizer que eles não poderiam ser considerados policiais. O secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, afirmou que, mesmo livres, os acusados não voltariam a atuar nas ruas. Já o comandante da Polícia Militar, Ubiratan Ângelo, achou a comemoração normal.

 

Os 44 mandados de prisão foram expedidos na tarde de ontem. Os suspeitos vão se juntar aos outros 30 PMs também acusados de receber propina de bandidos de favelas de Caxias. Sete traficantes que participariam do esquema também estão na cadeia.

 

Ainda sem saber que voltariam para trás das grades, durante todo o dia de ontem diversos policiais estiveram no 15º BPM. Muitos queriam saber para onde seriam transferidos. Já outros foram à unidade resolver pendências de antes de suas prisões, como férias, folgas devidas e até licenças para casamento.

 

 

Propinas eram pagas em três dias

 

Calados e evitando conversar com a imprensa, os policiais mudaram de fisionomia a partir do meio da tarde. A notícia de que voltariam para a prisão já circulava no batalhão, mas eles ainda não haviam sido informados oficialmente.

 

Defensor de três dos acusados, o advogado Nélio Andrade disse que seus clientes vão se apresentar imediatamente, assim que receberem a comunicação oficial da ordem de prisão. "Vamos analisar agora quais são os fundamentos dessa prisão e tentar novamente a revogação", disse, prevendo uma série de reviravoltas ao longo do processo.

 

Segundo a denúncia do Ministério Público, os 74 policiais, de diversas unidades do 15º BPM, como os Grupos de Ação Tática (GATs), o Serviço Reservado (P-2) e os Destacamentos de Policiamento Ostensivo (DPOs), achacavam traficantes das favelas de Parada Angélica e Santa Lúcia. Organizados em "bondes" (comboios), eles cobravam propina para não reprimir o tráfico.

 

Os valores, segundo o Ministério Público, eram pagos por duas mulheres às sextas-feiras, aos sábados e domingos. Em alguns casos, relata o MP, policiais de um "bonde" recebiam o dinheiro em nome de outro, o que, segundo promotores, demonstra a organização da quadrilha.

 

Além de oferecer nova denúncia, o MP tinha como opção recorrer da decisão do juiz Paulo Cesar Vieira de Carvalho Filho. A solução adotada foi considerada a melhor pelo professor de direito processual penal Francisco Ramalho Ortigão Farias, da Faculdade Nacional de Direito da UFRJ, por ser mais rápida. "O Ministério Público escolheu acertadamente o caminho mais rápido. O recurso tem um procedimento muito demorado", comentou.

 

O GLOBO teve acesso à decisão do juiz que libertou na terça-feira os policiais. Consultados, advogados e professores de direito consideraram correto o entendimento do magistrado.

 

Num trecho da decisão, o juiz afirma que somente alguns dos policiais "têm suas condutas especificadas na denúncia, com a indicação dos locais em que serviam (...), bem como os valores que receberiam e os bondes a que pertenceriam, enquanto para outros a denúncia nada descreve nesse sentido." Para justificar o entendimento de que houve erro dos promotores, Paulo Cesar afirmou que a Polícia Civil e o MP tinham condições de especificar a conduta de todos os policiais suspeitos, mas não o fizeram. "A deficiência da narrativa (...), que não especifica minuciosamente suas condutas, poderia ter sido superada através de diligências outras efetivadas na fase de inquérito ou até mesmo de análise detalhada do material já existente? A resposta que se impõe é afirmativa", concluiu.

 

Para o ex-professor e advogado especializado em direito processual penal Michel Assef, a decisão do juiz é tecnicamente perfeita. Ele explicou que denúncias que não especificam a conduta dos acusados infringem o princípio da ampla defesa. "Existe um princípio em direito que diz que é melhor muitos culpados soltos do que um inocente preso. Ao MP cabe descrever a conduta. Não basta dizer que alguém cometeu um crime, se não disser como cometeu", destacou.

 

A mesma opinião tem a conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e advogada criminalista Márcia Dinis. "O acusado se defende dos fatos a ele imputados. Se a denúncia não diz quais são esses fatos, como vai ele se defender?", disse.

 

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