22/02/2010 - 16:06

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À frente do Colégio de Presidentes do TJ, Faver quer autonomia dos tribunais

À frente do Colégio de Presidentes do TJ, Faver quer autonomia dos tribunais


Do Jornal do Commercio

22/02/2010 - No 3º Encontro Nacional do Judiciário, que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) realizará no próximo dia 26, em São Paulo, os dirigentes dos tribunais levarão um recado: as novas metas de nivelamento da Justiça para 2010, que serão estabelecidas na ocasião, não poderão interferir na autonomia conferida pela Constituição às cortes. Quem informa é o presidente do Colégio Permanente de Presidentes de Tribunais de Justiça, desembargador Marcus Faver.

O magistrado foi reeleito no fim do ano passado para comandar a entidade por mais dois anos. Ele reassumirá o cargo no dia 25 do próximo mês, em uma posse discreta. Na avaliação dele, é legitima a crítica dos tribunais de que, por vezes, o órgão de fiscalização e estratégia do Judiciário se excede ao estabelecer regras de conduta ou administrativas.

"A maioria das medidas tomadas pelo CNJ é altamente positiva para melhorar a prestação jurisdicional no Brasil, particularmente no tocante às gestões. O que me parece é que, às vezes, nesse afã de buscar o que será melhor para a administração dos tribunais, o CNJ está avançando na regra constitucional que assegura autonomia e independência das cortes para a realização e fixação de seus serviços administrativos", afirmou Faver, que já fez parte da primeira composição do CNJ e é desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ), cargo que está prestes a deixar em razão da aposentadoria compulsória.

De acordo com Faver, os tribunais irão fazer reivindicações no encontro e apresentar sugestões para as novas metas. Essas reivindicações se baseiam praticamente em um ponto: no respeito à autonomia e independência dos tribunais.


Leia abaixo a entevista.


Como presidente do Colégio Permanente de Presidentes de Tribunais de Justiça, o senhor poderia adiantar qual seria a expectativa dos dirigentes das cortes do País quanto às novas metas de nivelamento que serão estabelecidas pelo CNJ?

Imagino serem três as metas factíveis e necessárias: as que visam o tempo razoável do processo, as decisões tecnicamente corretas e as decisões eticamente justas. Acho que essa trilogia preside, desde a época que passei pelo Conselho Nacional de Justiça, a orientação que se propõe a tomar. Esses três objetivos consagram realmente a grande conquista do Judiciário brasileiro.


Uma das críticas feitas por alguns setores da magistratura seria de que o CNJ estaria se excedendo ao estabelecer as metas. Qual é sua opinião sobre isso?

O que me parece que tem ocorrido é que o CNJ não tem levado muito em consideração as diferenças de cada estado ao procurar igualar todos os tribunais como se estes pertencessem a um País que não fosse federal. O Brasil é uma federação, tem circunstâncias sociais e formações culturais diferenciadas. Acho que essa procura é um equívoco em termos de filosofia política porque, quando reduzimos o poder da federação, diminuímos também as características regionais. Penso que não podemos aplicar as mesmas regras de São Paulo no Piauí, ou no Amazonas. Esses estados têm diferenças que vão do clima à cultura e ao poder econômico. Acho que o equívoco às vezes cometido pelo CNJ se situa nessa postura de tentar, mesmo com a melhor das intenções, igualar coisas desiguais. É algo que não dá certo. Daí a resistência de muitos tribunais na aplicação de algumas resoluções do CNJ.


O senhor não acha que a resistência também não decorreria de certo corporativismo?

Penso que não. Os méritos do conselho são excepcionais. A maioria das medidas tomadas pelo CNJ é altamente positiva para melhorar a prestação jurisdicional no Brasil, particularmente no tocante às gestões. O que me parece é que, às vezes, nesse afã de buscar o que será melhor para a administração dos tribunais, o CNJ está avançando na regra constitucional que assegura autonomia e independência das cortes para a realização e fixação de seus serviços administrativos. Essa é uma zona cinzenta. A Constituição assegura expressamente, no artigo 126, a autonomia e a independência dos tribunais para a fixação de seus serviços e suas administrações.

De certa forma, uma norma geral determinada pelo CNJ acaba por invadir essa autonomia, e isso provoca certa resistência. Os tribunais levam muito a sério essa sensação de independência. Parece-me, então, que esse é o ponto nevrálgico da questão. No entanto, posso assegurar que os tribunais não se insurgem contra as medidas corretas e as posturas éticas que o conselho vem determinando. Pelo contrário, os tribunais aplaudem as atitudes do CNJ. A resistência existe quando há uma invasão às suas autonomias, pois isso é algo muito caro e preservado nos tribunais do País.


Essa seria, então, uma questão de conter a atuação do CNJ ou de mudar a lei?

O CNJ, como é um órgão relativamente novo - está em sua terceira gestão -, ainda não sedimentou inteiramente o teor da sua competência estabelecida no artigo 104, letra b, da Constituição, com a aprovação da Emenda Constitucional 45/2004, que promoveu a reforma do Judiciário. Acho que às vezes há uma invasão de competência, particularmente nos critérios de conveniência e oportunidade dos tribunais.

Vou citar um exemplo: os critérios para a fixação de residência na comarca e de remoção ou licença para os juízes. Essas são medidas fixadas segundo a conveniência ou oportunidade das cortes. O CNJ não deve invadir esses critérios. No entanto, as grandes regras, como a de reduzir o estoque de processos, conter o nepotismo, reduzir o corporativismo e limitar os privilégios ou as gratificações, isso tudo é altamente positivo. O que não se pode, e aí está o equívoco, é invadir a autonomia administrativa dos tribunais e passar o CNJ a ditar as regras de conveniência e oportunidade que são exclusivas das cortes.


Como o senhor avalia a atuação do CNJ em relação ao estabelecimento de metas?

Acho que é altamente positiva. A própria criação do conselho, que contou com muitas resistências, porque a magistratura não via com bons olhos a criação de um órgão de controle externo, passou a ser vista com outros olhos. O que se reclama às vezes, com alguma razão, é que na composição do CNJ, a magistratura de modo geral foi relegada a um segundo plano. Há no conselho elementos mais externos do que internos, muitos dos quais não conhecem o funcionamento do Judiciário.

Muitos dos integrantes do conselho nunca vivenciaram as dificuldades da magistratura. Então, essa falta de conhecimento de parte dos integrantes dificulta a adoção de medidas que venham a favorecer o funcionamento da estrutura do Judiciário. O CNJ é hoje um órgão altamente importante e essencial. O problema é a sedimentação que terá que fazer. Como todo órgão novo, demandará algum tempo para sedimentar sua competência, metas e propósitos.


Que sugestões de metas os tribunais teriam para o Encontro Nacional do Judiciário, que o conselho realizará no próximo dia 26, em São Paulo?

Os tribunais vão levar suas reivindicações. Elas se baseiam praticamente em um ponto: no respeito à autonomia e independência dos tribunais. Tudo gira em torno disso. Os tribunais não querem e nunca tiveram desejo de se confrontar com o CNJ. Pelo contrário, a grande maioria das metas foi aceita e aplaudida pelos tribunais. Eles só querem que o conselho respeite a autonomia que lhes foi dada pela Constituição. Esse é o ponto.


O senhor foi reeleito recentemente para a presidência do Colégio Permanente de Presidentes dos Tribunais de Justiça. Quais são suas metas?

Cumprirei um mandato de dois anos. A meta do colégio é importantíssima. Como somos uma federação, cada tribunal tem sua autonomia e independência. Muitas gestões, algumas altamente positivas, não se comunicam com as de outros tribunais. Por exemplo: o que ocorre no Tribunal de Justiça de São Paulo, pouca gente do Tribunal de Justiça do Rio sabe, e são estados vizinhos. Então, a meta básica do colégio é realizar reuniões periódicas, de dois em dois meses, com os presidentes dos tribunais, para possibilitar a troca de experiências na área administrativa, para que um possa copiar o outro. O presidente do colégio é quem faz essa interligação.

Essa, portanto, é a primeira meta. A segunda é a preservação dos critérios dos conceitos institucionais que devem pautar os tribunais. Temos que respeitar cada corte, fazer com que seus critérios sejam levados em consideração dentro de um panorama geral. As gestões mudam a cada dois anos. O colégio também procura preservar a memória das atividades administrativas de cada tribunal e disseminar as experiências administrativas positivas entre os presidentes de tribunais.


O senhor prepara-se para deixar o Tribunal de Justiça do Estado do Rio. Que balanço faria de sua carreira?

Foi uma carreira de muito sucesso. Talvez eu tenha sido o único presidente de tribunal que além do TJ-RJ, tenha passado também pela presidência do Tribunal Regional Eleitoral do Rio e do Colégio Permanente de Presidentes de Tribunais, além de ter participado da composição do CNJ.

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