13/08/2008 - 16:06

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Contrariando STF, Polícia Federal algema 32 suspeitos

Contrariando STF, Polícia Federal algema 32 suspeitos


Do jornal O Globo

13/08/2008 - Na primeira grande operação desde que o Supremo Tribunal Federal (STF) tomou a decisão de limitar o uso de algemas no Brasil, a Polícia Federal prendeu e algemou ontem 32 pessoas envolvidas com corrupção na superintendência do Incra e na Receita Federal de Mato Grosso.

Os presos são suspeitos de receber propinas para a liberação de certidões para a venda de propriedades rurais, entre outros crimes. Advogados dos presos protestaram contra a exposição dos clientes, que foram, inclusive, fotografados com as algemas ao serem presos. A operação foi batizada de Dupla Face pela PF.

A Justiça Federal em Cuiabá expediu 34 mandados de prisão e 65 de busca e apreensão de documentos nas cidades de São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Mato Grosso do Sul e, principalmente, Mato Grosso, onde funcionava a base do esquema.

Vinte e oito prisões foram cumpridas em Cuiabá. Os mandados de prisão são contra 13 servidores do Incra, três da Receita Federal e 16 despachantes, que faziam a intermediação entre os servidores e as pessoas interessadas em obter benefícios nos órgãos públicos. Entre os presos está o procurador do Incra Antônio Reginaldo Galdino Delgado. Segundo o delegado federal Luciano de Azevedo Salgado, responsável pelo inquérito, o procurador do Incra "dava pareceres favoráveis aos interesses da quadrilha".

Até a noite de ontem, a PF ainda procurava duas pessoas cujos nomes não foram revelados


OAB de Mato Grosso protesta contra PF

O advogado José Petan Toledo Piza, que defende nove presos, entre eles o procurador Delgado, protestou na frente do prédio da PF contra o uso das algemas.

"São todos funcionários públicos, eles não oferecem perigo. Por que algemá-los? Talvez para contrapor a decisão do STF. Agora, as algemas já os condenaram perante a sociedade", disse o advogado.

Toledo Piza informou que ontem mesmo iria entrar com o pedido de relaxamento da prisão de seus clientes. Outros dois advogados, que não quiseram se identificar, também condenaram a exposição dos detidos.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Mato Grosso protestou contra a operação. O presidente da entidade, Francisco Faiad, anunciou que vai ouvir os depoimentos dos presos e enviá-los à Justiça Federal de Cuiabá e ao Ministério da Justiça, a quem a PF está subordinada. Ele quer punição aos policiais federais envolvidos na operação.

"O que houve aqui foi um abuso de autoridade. Mais um espetáculo para a mídia", disse Faiad.

No último dia 7 de agosto, o STF anulou a condenação do pedreiro Antônio Sérgio da Silva, de Laranjal Paulista, por homicídio sob o argumento de que sua permanência algemado perante o júri popular influenciou no veredicto que fixou a pena em 13 anos e seis meses de prisão por ter assassinado, a facadas, o marceneiro Marcos Djalma de Souza Soares.


Superintendente da PF defende algemas

Com a decisão, o Supremo estabeleceu que o uso de algemas só pode ocorrer quando há "evidente perigo de fuga ou violência" por parte do preso. A decisão deve se transformar em súmula vinculante, mecanismo segundo o qual as instâncias inferiores terão que seguir o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal ou tribunais superiores.

Por enquanto, a decisão só vale para o caso específico do pedreiro de Laranjal Paulista, que será submetido a um segundo julgamento. O STF ainda precisa redigir e votar a redação da súmula vinculante para que ela passe a ter validade, o que será feito nas próximas semanas.

O superintendente da PF em Cuiabá, Oslaim Campos Santana, defendeu o uso das algemas. Segundo ele, tratase de um procedimento padrão adotado em operações policiais. "A algema é uma proteção tanto para o suspeito quanto para o policial. Depois que alguém é preso, nunca se sabe qual é sua reação. E se, por um acaso, nós o prendermos por um crime menor e o cidadão cometer um homicídio? Ele pode ter uma reação violenta", disse Oslaim Santana.

Segundo o delegado, o manual de procedimentos da PF estabelece o uso das algemas e a proteção da imagem do acusado. Na Operação Dupla Face, no entanto, os presos foram filmados e fotografados pelas equipes de reportagem. No final da tarde, a PF os levou em um ônibus para realizar exame de corpo de delito no Instituto Médico Legal (IML).

Também neste momento a imprensa conseguiu registrar novas imagens dos presos com as algemas.

A operação foi batizada de Dupla Face em razão de a maior parte dos acusados ser formada por servidores públicos, que "aparentavam possuir conduta ilibada, entretanto se locupletavam ilicitamente através de habitual recebimento de propina", segundo a PF.

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