26/11/2014 - 16:41 | última atualização em 26/11/2014 - 18:31

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Comissão da Verdade da Escravidão: ato ressalta dificuldade de ações afirmativas no Brasil

redação da Tribuna do Advogado

A OAB/RJ e a Caarj realizaram na terça-feira, dia 25, um ato em apoio à criação da Comissão da Verdade da Escravidão Negra pela OAB Nacional. A criação do grupo, anunciada durante a 22ª Conferência Nacional dos Advogados, em outubro, e aprovada em votação no início de novembro, visa a apurar os crimes cometidos nesse contexto histórico e fazer um resgate social da contribuição negra no país a partir de pesquisa sobre episódios pouco conhecidos. "Em todo o mundo, existem políticas de ação afirmativa. Mas no Brasil é difícil fazer o debate, como se pode comprovar pelo discurso reacionário contra as cotas raciais. Se já houve essa reação contra as cotas, vai haver uma guerra civil quando colocarmos a reparação na ordem do dia", afirmou o presidente da Comissão de Igualdade Racial (CIR) da OAB/RJ, Marcelo Dias, que fez um breve relato da criação de diversas comissões locais em todo o país, em paralelo à formação da comissão nacional.
Como na comissão da ditadura, o Brasil precisa enfrentar sua própria imagem no espelho, ou seguirá assombrado por esses fantasmas
Wilson Prudente
procurador do Ministério Público Federal 
 
Dias leu o ofício que o presidente da OAB Nacional, Marcus Vinícius Furtado, encaminhou ao governo federal, sugerindo a criação, nos moldes da Comissão Nacional da Verdade (CNV), da Comissão Nacional da Verdade sobre a Escravidão Negra.
 
A polêmica gerada pelas cotas também foi citada pelo vice-presidente da Comissão de Igualdade Racial da OAB Nacional, Humberto Adami, que ressaltou o aspecto do resgate histórico a ser feito. "Mesmo após o Supremo Tribunal Federal (STF) garantir as cotas, continua havendo resistência a essa política. Sobre a reparação, há propostas de indenização financeira aos descendentes, mas aí a conversa acaba antes de começar. Essa comissão que estamos criando é da memória e da verdade sobre a escravidão, o objetivo é fazer um grande levantamento histórico que permitirá a construção da reparação", explicou Adami, convocando as entidades presentes a pressionarem o governo federal pela instalação da comissão no âmbito do poder executivo.
 
A diretora presidente do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (Ipeafro), Elisa Larki, relembrou conquistas - como a Lei Afonso Arinos e o Estatuto da Igualdade Racial – e reafirmou a importância de ações do Estado na luta contra a discriminação. "É necessário termos políticas públicas efetivamente capazes de garantir a reparação para os crimes da escravidão", disse a professora, que é viúva de Abdias Nascimento. Já o defensor público geral do Estado do Rio de Janeiro, Nilson Bruno, elogiou a iniciativa da Ordem.
 
"É uma iniciativa feliz da OAB, progressista e desafiadora. Já está clara a importância das cotas raciais em nossa sociedade, e estamos aqui para unir forças porque é necessário avançar ainda mais", argumentou. Para a assessora da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM-RIO) Vanda Ferreira, a criação da comissão marca um momento histórico. "Este ato é uma prova da unidade do movimento negro. Esta comissão vem reforçar a importância da reparação no Brasil", declarou ela, citando como exemplo a possibilidade de o trabalho da comissão auxiliar em aulas sobre a escravidão nas escolas. "Cada profissional em sua área poderá usar esse instrumento no combate ao racismo”, acrescentou ela.
 
Segundo um dos formuladores do arcabouço jurídico da proposta, o procurador do Ministério Público Federal Wilson Prudente, a criação da comissão se dá "sob a sombra das vítimas do racismo" de todas as gerações anteriores. "É em nome dessas vítimas que queremos a instalação da comissão. A sociedade brasileira é pós-moderna, industrializada, mas ainda é assombrada pelos fantasmas da escravidão. Como na comissão da ditadura, o Brasil precisa enfrentar sua própria imagem no espelho, ou seguirá assombrado por esses fantasmas", ponderou o procurador, que foi indicado por aclamação pelos presentes para compor a Comissão da Verdade da Escravidão Negra pela OAB Nacional.
 
Diversos representantes do movimento negro também participaram do ato, como o superintendente de Promoção da Igualdade Racial do Rio de Janeiro e membro da CIR da OAB/RJ, Rogério Gomes; o presidente do Instituto de Cultura e Consciência Negra Nelson Mandela, José Carlos Brasileiro; a coordenadora-geral da União de Negros Pela Igualdade do Rio de Janeiro (Unegro-RJ), Cláudia Vitalino, entre outros.
 
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