11/09/2015 - 18:23 | última atualização em 14/09/2015 - 13:37

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Comissão da Verdade aponta suspeitos de atentado à OAB em 1980

redação da Tribuna do Advogado

A Comissão Estadual da Verdade (CEV-Rio) apresentou, em entrevista coletiva nesta sexta-feira, dia 11, na sede da OAB/RJ, o relatório com a conclusão das investigações do atentado à sede do Conselho Federal da OAB no dia 27 de agosto de 1980. A comissão, após mais de dois anos de trabalho no caso, chegou à conclusão de que grupos de oficiais do Centro de Informação do Exército (CIE) são os responsáveis pelo atentado – no qual uma carta bomba endereçada ao então presidente da Ordem, Eduardo Seabra Fagundes, explodiu e matou a secretária Lyda Monteiro da Silva. Na época, a sede da entidade ficava no Rio de Janeiro, no prédio onde hoje funciona a Caarj.
 
O vice-presidente da OAB/RJ, Ronaldo Cramer, representou o presidente Felipe Santa Cruz. “O atentado marcou a advocacia, porque mostrou que quando a Ordem é atacada, reage com mais força. Esse episódio ajudou a forjar nossa entidade e a advocacia brasileira. Estaremos sempre defendendo a democracia, a ordem jurídica, o Estado de Direito. Sinto-me aliviado com o esclarecimento feito hoje”, afirmou.
 
O relatório apresentado pela presidente da comissão, Rosa Cardoso, apontou que quem entregou a carta bomba à D. Lyda foi o sargento Magno Cantarino Mota, da turma de paraquedistas do Exército, que era ligado ao CIE e adotava o codinome “Guarani”. A comissão chegou a quatro testemunhas, sendo uma delas ocular, cujo nome os membros da comissão fizeram questão de preservar, e que reconheceu “Guarani” como a pessoa que portava a carta. O militar ainda está vivo e, segundo as investigações, mora em Campinho, na Zona Oeste da cidade.
 
Ainda segundo o relatório, a ação foi comandada pelo coronel Fred Perdigão Pereira, também do CIE, além do sargento Guilherme Pereira do Rosário, que confeccionou o artefato. Rosário morreu em 1981, com uma bomba no colo, durante o atentado do Riocentro – o sargento e outro militar tentavam instalar uma bomba em um auditório com 20 mil pessoas que comemoravam o Dia do Trabalho, quando a mesma explodiu ainda dentro do carro.
 
“Estamos aqui sem ódio, sem ressentimento, sem preconceito, no sentido de poder compreender que pessoas que participaram desses fatos podem hoje ter uma visão critica a respeito de sua conduta. O sentimento é de um dever que membros da Comissão da Verdade têm de revelar atrocidade que ocorreram no passado, para que elas não se repitam. É importante revelar todas as circunstâncias e nomear os autores, para afastar visões que negam o que de fato houve”, disse Rosa Cardoso, antes de ler o resumo do relatório.
 
Wadih Damous revelou que tinha uma vontade pessoal de esclarecer o caso. “O atentado na OAB era crucial para mim. Quando dividimos as tarefas entre os membros da comissão, assumi essa investigação. A Ordem foi alvo do atentado porque a advocacia esteve na linha de frente contra a ditadura. Lutávamos na época pela anistia e pela responsabilização dos agentes torturadores. O atentado à OAB e ao Riocentro estavam ligados. Todo o perfil desses agentes comprova que foram treinados para isso, e pertenciam à mesma turma na escola de paraquedismo. Faltava apenas a comprovação final, que temos agora”, afirmou. Em seguida, o ex-presidente da Seccional reforçou pedido feito pelo presidente Felipe Santa Cruz para que o Conselho Federal devolva ao Rio de Janeiro a mesa de D. Lyda, em um ato simbólico.
 
O filho de D. Lyda, Luís Felippe Monteiro, participou da entrevista. Ele agradeceu o empenho das pessoas que ajudaram a esclarecer o caso. “Os grandes protagonistas da manhã de hoje são os integrantes da Comissão da Verdade do Rio de Janeiro, que finalmente após 35 anos reestabeleceram a verdade e com isso marcaram a história do nosso país. Na maior parte desses 35 anos, sofri mais do que a perda da minha mãe pela ação terrorista, pois também sofri muito pelo descaso do Estado brasileiro. O sargento Rosário, que agora sabemos que foi quem preparou a carta bomba, foi enterrado com honras militares após o caso do Riocentro”, condenou. Monteiro declarou que, “agora que a verdade está devidamente contada e a história reestabelecida”, sente-se livre de um peso imenso. “Meus filhos mais velhos estudaram o caso do atentado à OAB no ensino médio, mas não havia desfecho apresentado nos livros escolares. Agora, meus pequenos, quando chegarem lá, terão a historia completa com todos os elementos devidamente registrados”, completou.
 
O presidente da OAB Federal, Marcus Vinícius Furtado, ressaltou o papel da entidade na mobilização em torno do caso. “Este é um encontro do Brasil com a nossa história. Mas temos a obrigação legal de levar o fato ao conhecimento das autoridades responsáveis. Vamos ao procurador-geral da republica, para que verifique a responsabilidade penal, já que a lei de anistia é de 1979 e não se aplica a este caso, de 1980. O crime é imprescritível, foi um ato de terrorismo. E vamos também ao ministro da Defesa, para que além de pedir desculpas à família de D. Lyda, como pediu seu filho, e também à Nação e à OAB, ele também possa observar a responsabilização dos superiores hierárquicos”, explicou. Outra providência diz respeito à mesa de D. Lyda.
 
“Vou levar ao Conselho a solicitação da OAB/RJ, que já havia sido feita pelo presidente Felipe Santa Cruz e hoje foi reiterada pelo ex-presidente Wadih Damous, de que a mesa que se encontra no museu da OAB Nacional seja transferido para a Seccional do Rio de Janeiro. Se for autorizado, desejo realizar esse ato no mês de novembro, em um ato que deve marcar a luta pela democracia em nosso país”, concluiu. A mesa da entrevista teve ainda a presença da integrante do Subcomitê para Prevenção da Tortura da Organização das Nações Unidas (ONU) Margarida Pressburger; e da secretária de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos (SEASDH), Teresa Cosentino.
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