03/08/2016 - 13:26 | última atualização em 03/08/2016 - 13:25

COMPARTILHE

Candidatos por cota racial terão que comprovar a cor

jornal O Globo

Candidatos que concorrem à reserva de 20% das vagas em concursos federais, determinada por lei como uma política de ação afirmativa, terão de comprovar se são, de fato, negros. Segundo regras publicadas ontem pelo Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, cada órgão deverá instituir uma comissão avaliadora que fará a verificação.
 
Pelas orientações, continua valendo o critério básico da autodeclaração. No entanto, o candidato que se identificar como negro para acessar o sistema de cota do concurso, a partir de agora, terá que passar por uma avaliação presencial em que serão verificados "tão somente os aspectos fenotípicos" diz o texto publicado pelo governo. Ou seja, a comissão analisará as características aparentes dos indivíduos.
 
Para Humberto Adami, presidente da Comissão Nacional da Verdade da Escravidão Negra no Brasil, ligada ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, as comissões de avaliação aperfeiçoarão a política afirmativa de reserva de vagas no serviço público federal, instituída por lei sancionada em 2014: "Não tardará para que os opositores das políticas de reparação venham falar na existência de um tribunal racial no Brasil. Não se trata disso. Essas regras são importantes para evitar fraudes que vêm sendo noticiadas em universidades e, agora, no serviço público. Quando se trata de uma política em grande escala, é preciso adotar medidas como essa, embora sempre haja reclamações", afirmou Adami.
 
As regras determinam ainda que os editais das seleções públicas já tragam os métodos de verificação da condição de negro do candidato, indique a comissão que fará a análise e informe o momento do concurso em que se dará a checagem. É necessário também que o candidato desclassificado possa recorrer da decisão. Mas, segundo a orientação do governo, na hipótese "de constatação de declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso".
 
A comissão formada para checar se os autodeclarados negros cumprem a condição para disputar dentro da reserva de vagas deverá ter "membros distribuídos por gênero, cor e, preferencialmente, naturalidade" diz o texto do governo.
 
As regras devem valer até para concursos em andamento. Neste caso, as bancas podem fazer retificações em seus editais para incluir a fase de checagem da cor dos candidatos que se autodeclararam negros. A nova norma vale nas seleções para cargos efetivos na Administração Pública Federal direta, mas também para empregos públicos em fundações e sociedades de economia mista controladas pela União, como bancos.
 
A lei de 2014, que instituiu 20% de vagas para negros em concursos públicos da esfera federal, tem validade de dez anos. Muitos órgãos, para evitar problemas, passaram a exigir que os candidatos enviassem fotos para que fosse feita a checagem da condição de cor. Mas tentativas de fraude levaram algumas seleções a serem questionadas.
 
No ano passado, a Polícia Federal foi obrigada, por decisão judicial, a anular a regra do edital do concurso público para agente que exigia dos candidatos o envio de fotos para comprovação. Com isso, foi feita uma nova convocação para o procedimento de verificação pessoal da condição de negro.
 
A nova regra adotada pela PF, que se assemelha à orientação do governo federal publicada ontem, ocorreu em virtude de ação do Ministério Público Federal (MPF) contra a forma de seleção por meio de fotos. O MPF argumentou que o método por meio de fotografia tirada pelo próprio candidato pode gerar "grave insegurança" E defendeu o critério de análise pessoal do candidato.
 
Questionamentos em relação ao Itamaraty, que também tem sistema de cotas raciais, também são recorrentes. A Justiça Federal determinou, no ano passado, que cinco candidatos a vagas no concurso para diplomata destinadas a afrodescendentes não tomassem posse, por não apresentarem cor de pele ou traços físicos característicos de pessoas negras. Com o imbróglio, o Ministério das Relações Exteriores adotou entrevista pessoal com os aspirantes à carreira. Dos cinco casos questionados, quatro tiveram a autodeclaração indeferida pelo comitê que os analisou.
Abrir WhatsApp