27/10/2011 - 17:03

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Câmara aprova fim da prescrição de crimes da ditadura no Uruguai

site Globo.com

Depois de um debate de mais de 13 horas, a Câmara do Uruguai aprovou na madrugada desta quinta-feira uma lei que impede a prescrição de crimes contra os direitos humanos cometidos durante a ditadura (1973-1950), abrindo caminho para processos contra militares. A vitória governista foi apertada: : 50 votos a favor, contra 41 dos 44 opositores. A medida já havia passado no Senado, por 16 votos contra 15, e segue agora para a formalização com a promulgação do Executivo.

Na Câmara, só votaram a favor do controverso projeto os deputados da Frente Ampla, coalizão de esquerda que apoia o presidente José Mujica - um ex-guerrilheiro das décadas de 1960 e 1970 que esteve preso durante anos. Os governistas só conseguiram alcançar seu objetivo às 2h14m, depois de um intenso debate, que teve momentos ásperos.

A Frente Ampla, no poder desde 2005, impulsionou a nova lei após a Suprema Corte ter decidido em maio que os crimes cometidos durante o regime militar são delitos comuns e não de lesa humanidade. A chamada Lei da Caducidade está em vigor desde a década de 80 e foi ratificada em duas consultas populares (em 1989 e 2009).

A decisão da Suprema Corte abriu um precedente para considerar que as violações aos direitos humanos cometidas sob o regime militar deixariam de ser puníveis a partir de 1º de novembro, por serem considerados delitos comuns e, por isso, passíveis de prescrição.

O início do debate na Câmara, composta por 99 membros, sendo 50 da coalizão governista, foi marcado por momentos de tensão. Ao menos 63 se inscreveram para falar sobre o tema. Ao final da votação, apenas 91 estavam presentes no plenário.

Durante o pronunciamento do deputado Luis Puig, do Partido da Vitória do Povo (PVP), a secretária do deputado colorado Aníbal Gloodtdofsky, que estava assistindo a sessão disse:

"Justiça para todos, inclusive para os que mataram vocês".

Deputados discutem durante sessão na Câmara - AFP

Momentos depois ela se retirou do local por conta própria e o presidente da Câmara pediu para que as declarações prosseguissem normalmente. Puig tinha sobre a mesa uma foto de Elena Quinteros, desaparecida em 1976, durante a ditadura. Já os opositores deixaram sobre suas mesas cópias da Constituição.

Ao longo da tarde, outras discussões explodiram entre os deputados. A bancada da Frente Ampla protestou quando o deputado Gustavo Borsari começou a ler um editorial do diário comunista "El Popular" e a sessão foi suspensa por cinco minutos.

Puig afirmou que foi uma "jornada histórica" já que "depois de 25 anos de impunidade, a justiça e a verdade poderão avançar".

"Aqui foram protegidos os atos de terrorismo do Estado, se impediu de investigar, se deu as costas às vítimas", disse o deputado, destacando que a Suprema Corte de Justiça e a Corte Interamericana de Direitos Humanos catalogaram a Lei de Caducidade como um "obstáculo para o desenvolvimento da justiça no país".

Apesar da lei de 1986, dez militares foram presos, incluindo o ditador Gregorio Alvarez. Foi processado também o ex-presidente Juan María Bordaberry, que faleceu em julho.

Cerca de 200 pessoas morreram e milhares foram torturadas ou vítimas de outros abusos em mãos de militares durante a ditadura. Muitas outras fugiram para o exílio. Aproximadamente 130 denúncias recentes de delitos de lesa humanidade se somaram aos mais de 80 casos já conhecidos relativos à ditadura.
 
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