21/11/2008 - 16:06

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Câmara aprova cotas sociais para universidade

Câmara aprova cotas sociais para universidade


Do jornal O Globo

21/11/2008 - De afogadilho, a Câmara aprovou nesta quinta, 20, projeto que cria reserva de vagas para alunos de escolas públicas em instituições federais de ensino superior e de educação técnica. Na última hora, os deputados fizeram uma mudança importante no projeto, que já fora aprovado pelo Senado: além das cotas raciais, haverá uma cota social, baseada na renda familiar, para beneficiar os estudantes mais pobres.

O texto estabelece a reserva de, no mínimo, 50% das vagas (por curso e turno) oferecidas pelas instituições a estudantes que tenham cursado, integralmente, os três anos do ensino médio em escolas públicas. Dentro desses 50%, agora há outros dois critérios a serem obedecidos: a renda familiar (metade dessas vagas será preenchida por estudantes com renda familiar de até um salário e meio per capita) e a questão racial.

Por causa da mudança - proposta pelo ex-ministro da Educação, deputado Paulo Renato Souza (PSDB-SP) -, o projeto voltará ao Senado.

Em cada estado, as vagas destinadas às cotas serão divididas de acordo com a proporção da variável étnica, tendo por base o último Censo do IBGE. Assim, se uma universidade oferece 200 vagas para Direito, cem serão reservadas para estudantes de escolas públicas que prestam o vestibular. Dessas, 50 serão ocupadas por estudantes de baixa renda, negros ou não. No caso do critério de raça, é preciso saber qual a porcentagem de negros, pardos e índios no estado.

Em 2004, o governo enviou ao Congresso proposta que previa a reserva de vagas para os estudantes do ensino público e a cota racial. Desde 2006, o projeto estava pronto para ir a plenário, mas PSDB e o DEM resistiam à proposta. Os tucanos queriam trocar o critério racial pelo de renda. Uma proposta da senadora Ideli Salvatti (PT-SC), de mesmo teor, foi aprovada este ano no Senado e enviada à Câmara. O projeto foi anexado aos que já tramitavam na Casa, mas ontem prevaleceu o substitutivo do deputado Carlos Abicalil (PT-MS).

Para viabilizar a votação nesta quinta, líderes do PT e do PSDB tentaram encontrar um texto de consenso. Foram incluídas emendas, escritas à mão, como a da reserva de vagas para os estudantes de baixa renda, de Paulo Renato.

"Minha tese era de que, com o critério de renda, o problema racial estaria resolvido. Mas parte do governo reiterou o compromisso com os movimentos raciais. O que se vota hoje são dois critérios: o racial e o de renda. Não é o ideal, na minha opinião, mas, para garantir o acordo, concordamos", disse Paulo Renato.


Artigo polêmico sobre dispensa de vestibular

O projeto, no entanto, segue para o Senado com um artigo polêmico e considerado inconstitucional.

Ele acaba com a exigência de exame de seleção e diz que serão consideradas, para a ocupação das vagas, as notas dos estudantes nos três anos do ensino médio. Abicalil, que não estava ontem em Brasília, acreditava que este artigo tinha sido retirado do texto.

"Ninguém é dispensado do vestibular, esse critério fere a autonomia das universidades", disse Abicalil, sinalizando que o artigo deverá ser retirado no Senado.

O ministro da Educação, Fernando Haddad, participou ativamente da negociação que permitiu a aprovação do projeto. De seu gabinete, por telefone, orientava o líder do governo, Henrique Fontana (PT-RS). O tom da conversa era tenso: num dos diálogos, Haddad quase gritava, a ponto de ser ouvido na sala ao lado, onde jornalistas o aguardavam para uma entrevista. Ele interrompeu a entrevista três vezes para falar com Fontana. "A discussão é sobre o corte de renda. O ingrediente novo é esse. Acho cabível", afirmou o ministro.

Haddad defendeu que o limite de renda familiar fosse o mesmo do programa Universidade para Todos (ProUni): um salário mínimo e meio por pessoa, no caso de quem ganha bolsa de 100% para estudar em instituições privadas.

Em relação à resistência de universidades federais contra a definição de uma regra nacional de cotas, já que diversas instituições adotam modelos distintos de reserva de vagas, o ministro lembrou que foi acertado um prazo de transição de quatro anos, o que garantiu o apoio da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes).

O coordenador nacional do Movimento dos Sem Universidade (MSU), Sérgio Custódio, comemorou a votação na Câmara: "O Brasil caminha para se equiparar ao resto do mundo, que vive um momento pósracista, após a eleição do presidente americano Barack Obama. Um mundo onde há espaço para a diferença", disse Custódio.

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