21/09/2015 - 12:17

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Audiências de custódia 24 horas após prisão revelam tortura

jornal O Globo

Olho roxo, costela quebrada e sangue na roupa foram alguns indícios de violência policial identificados em audiências de custódia, quando presos em flagrante são apresentados a um juiz em no máximo 24 horas. Fomentadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e adotadas em 20 estados, inclusive no Rio, essas audiências têm como objetivo principal evitar prisões desnecessárias. Mas colocar preso e magistrado frente a frente, logo após a detenção, tem se revelado também uma ferramenta para verificar a ocorrência de supostas agressões, maus-tratos e tortura.
 
Dados levantados pelo GLOBO apontam 366 denúncias de abuso feitas durante audiências de custódia em São Paulo, Minas, Espírito Santo e Rio Grande do Sul. Primeiro local a implantar o projeto, em fevereiro, a capital paulista tem a maioria dos registros. Há 277 apurações encaminhadas pelo Judiciário às corregedorias das instituições citadas: Polícia Militar, Polícia Civil ou Guarda Civil Metropolitana.
 
Coordenador do Departamento de Inquéritos Policiais e Polícia Judiciária da capital de São Paulo, setor responsável pelas audiências, o juiz Antonio Patino destaca suas vantagens: "O juiz pode verificar, a olho nu, que há algo de estranho fisicamente no detido. Nesse sentido, a audiência de custódia serve para coibir eventuais desvios do agente público e descartar procedimentos se verificamos, muitas vezes com a ajuda do exame de corpo de delito, que o relato não enseja apuração".
 
Viatura sobre o pé do preso
 
No Rio Grande do Sul, onde as audiências começaram em julho, já são 31 casos remetidos ao Ministério Público com pedido de apuração. No Espírito Santo, que implantou o projeto em maio, há 15 denúncias sob acompanhamento da Defensoria Pública. Em Minas, já foram formalizadas 43 reclamações desde julho. Mas só parte, diz a defensora Karina Maldonado, tomou-se apuração, devido ao medo dos presos de levarem adiante as denúncias.
 
Os casos estão em apuração, e não houve punições até agora. PMs são o alvo da grande maioria das denúncias, por serem os responsáveis, quase sempre, pela prisão. Há situações em que a violência é evidente, diz Aline Alcazar Barcelos, defensora pública no Espírito Santo: "Há casos em que as marcas são tão aparentes que não há como negar. Já pegamos pessoas muito machucadas, com costela fraturada. Mas a maioria dos relatos se refere a chutes, pisadas, enforcamento ou coronhadas".
 
Em São Paulo, um homem chegou à audiência mancando. Contou que os policiais, ao prendê-lo, mandaram que se deitasse no chão e passaram com a viatura sobre seu pé. A denúncia foi registrada pela Conectas Direitos Humanos, entidade que acompanha as audiências de custódia na capital paulista desde julho.
 
"Sem a audiência, esse relato se perdería, assim como marcas da agressão, mesmo que detectadas em corpo de delito. Isso porque o preso só veria juiz, promotor e defensor após meses na cadeia - diz o advogado Rafael Custódio, coordenador de Justiça da Conectas".
 
Assim que as audiências de custódia forem implantadas em todo o país, o presidente do CNJ, Ricardo Lewandowski, encaminhará resolução que prevê protocolo de apuração de denúncias de violência policial durante a prisão ao plenário da entidade.
 
Sexta-feira, o Rio lançou projeto piloto das audiências de custódia. Nos estados que já têm a iniciativa, o índice de soltura dos presos apresentados em até 24 horas varia de 35%, em Pernambuco, a 80,9%, em Roraima.
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