14/07/2015 - 17:57 | última atualização em 20/07/2015 - 14:35

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Ato na Seccional defende a diversidade de composições familiares

redação da Tribuna do Advogado

Em 2015, Toni Reis e David Harrad comemoraram 25 anos de união, ao lado de seus três filhos adotivos, Alysson, Filipe e Jéssica. Atualmente, eles são considerados uma família, mas isso vai mudar caso o Projeto de Lei (PL) 6583/2013, conhecido como Estatuto da Família, seja aprovado. Na redação do PL, apenas núcleos formados por um homem, uma mulher e seus descendentes são considerados família, o que exclui uniões homoafetivas, filhos adotivos, famílias monoparentais, casais sem filhos e outras composições de família.
 
A OAB/RJ discutiu o assunto em um ato realizado na segunda-feira, dia 13, e organizado pelas comissões de Direito de Família e Direito Homoafetivo da Seccional. O ato repudiou o estatuto e defendeu a inclusão de todas as formações familiares, tradicionais ou não, no conceito de família.
 
O presidente da Comissão de Direito de Família da OAB/RJ, Bernardo Garcia, considerou o PL uma aberração jurídica que visa marginalizar todas as famílias que não são constituídas por um homem e uma mulher. Ele ressaltou, entretanto, que mesmo que não sejam reconhecidas, existem diversas formações familiares e que a lei não vai mudar isso. “Esse estatuto não terá força para mudar a sociedade”, defendeu. Silvana do Monte Moreira, que integra a Comissão de Direito Homoafetivo da OAB/RJ, frisou que não são apenas as famílias homoafetivas que são excluídas com este projeto “Nada é mais diverso que a concepção de família”, opinou.
 
Outro problema que deve surgir caso o estatuto seja aprovado é o da definição de normalidade. Todas as situações que não estiverem contempladas na lei serão tidas como desviantes, o que pode acarretar problemas para as crianças e adolescentes que estiverem inseridos nessas outras formações familiares. A psicóloga do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ) Glícia Brazil defendeu esse ponto. “Havendo um modelo de família, o que fugir disso será tido como fora da norma. Com o tempo, o risco é que a sociedade passe a julgar as famílias que estiverem fora desse padrão”. Glícia explicou que é preciso fazer um exercício para não julgar e que cada um escolhe quem considera como família. “Tomo como exemplo um casal que se separa e o homem começa uma nova relação. Para ele, a família pode incluir os filhos do casamento anterior e a nova namorada. Para a criança, pode incluir a mãe, o pai e a nova companheira do pai. Em casos assim, é importante perguntar ‘quem é sua família? ’ e não julgar. Não pode haver culpa em amar”, afirmou.
 
Segundo o procurador de Justiça Sávio Bittencourt a magistratura brasileira foi vanguardista em garantir os direitos dos casais homossexuais. Em 2011, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a união estável entre casais homossexuais e em 2013, o Conselho Nacional de Justiça aprovou uma resolução que obriga os cartórios do Brasil a realizarem casamento entre pessoas do mesmo sexo. Já em relação ao Estatuto, diz que o conceito restritivo de família vai a reboque da definição da sociedade. “Esse conceito é metajurídico e não cabe no estandarte da lei”, enfatizou.
 
Responsável pela 3ª. Vara de Infância, Juventude e Idoso da Capital do TJRJ, a juíza Mônica Labuto defendeu que os direitos das crianças e famílias têm que ser garantidos. Ela fez um histórico das leis de adoção no Brasil desde 1979, quando só pessoas casadas há mais de cinco anos, salvo em caso de esterilidade de um dos cônjuges, eram aptas a adotar, definição dada pelo Código de Menores, documento que versava sobre a adoção naquela época. Também era preciso que os cônjuges tivessem mais de 30 anos.
 
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990, revogou essa lei e permitiu a adoção para pessoas maiores de 21 anos, comprovada a estabilidade da família. Em 2009, a adoção foi permitida para maiores de 18 anos e também permitiu que pessoas em união estável pudessem adotar. “Tanto na lei vigente hoje quanto na de 1979 não havia a menção das palavras homem e mulher para identificar o casal. A lei atual não gera dúvidas em relação à adoção homoafetiva. O ECA é muito mais abrangente que o Estatuto, que fala que família é formada por homem e mulher, o que pode gerar interpretações restritivas em relação ao juízo da infância”, disse Mônica, ao defender que o Estatuto não seja aprovado.
 
Ao final do evento, Alysson Harrad Reis lançou seu primeiro livro, chamado Jamily – A holandesa negra. A história de uma adoção homoafetiva, e contou sua história de mudança de vida. Alysson nasceu no Rio de Janeiro e depois de ser adotado por Toni e David se mudou para Curitiba, em 2011. Em 2013, chegaram os irmãos Filipe e Jéssica. Ele ressaltou que a adaptação não foi fácil, mas que aos poucos ele aprendeu que ter pais gays não era um problema. “Percebi que eles apenas eram diferentes, mas nossa família é uma família. Pagamos os mesmos impostos, vamos ao mesmo mercado e merecemos ser reconhecidos como família”, disse.
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