Direito e dever Janio de Freitas* A Comissão de Constituição e Justiça do Senado deve apreciar, hoje, o projeto que desobriga os eleitores de votar. Parte da ideia de que o voto obrigatório é imposição antidemocrática e contrária à liberdade do cidadão. Até poderia ser, caso a Constituição determinasse o voto obrigatório. Esta expressão apenas significa, porém, de forma imprecisa, a obrigação do dever cívico de integrar a escolha dos governantes. O que é feito pelo comparecimento à respectiva seção eleitoral. Onde o cidadão exerce o seu pleno direito de votar em alguém ou de preferir não fazê-lo. O comparecimento à seção eleitoral é obrigatório como tantos outros deveres o são: a intimidatória declaração de renda que raramente é renda e não salário; a inscrição masculina nas Forças Armadas mais de uma vez, a ida aos postos de identificação para os documentos pessoais, inclusive com periodicidade para o passaporte, e daí por diante. O comparecimento não é o voto e o voto não é obrigatório. Deixar o comparecimento à vontade do eleitor é para países com alguma educação política, mesmo os que suponham tê-la mais do que a têm. Grande parte da instabilidade política pré-ditadura no Brasil deveu-se a decisões eleitorais feitas com quantidades pouco expressivas de votos, muito dispersos entre vários candidatos. Caso da instabilidade no governo Juscelino, eleito com pouco mais de um terço dos votos. A criação do segundo turno veio atenuar esse problema. A tendência previsível é que, dispensado o comparecimento, a abstenção seja muito alta. Ao segundo turno iriam candidatos representativos de uma parcela mínima do eleitorado. Logo, assim seriam também os eleitos. Por si só, a falta de representatividade já seria muito negativa. E ainda daria margem a fermentações políticas e administrativas que deságuam em instabilidade. A qual nunca se sabe em que resulta. *Jânio de Freitas é jornalista. Artigo publicado na Folha de S. Paulo, em 9 de junho de 2010.