11/02/2016 - 10:20

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Para arrecadar mais, fisco aperta pequenas empresas

jornal Folha de S. Paulo

Durante a crise, as micro e pequenas empresas devem ficar mais atentas às armadilhas dos "exterminadores do futuro" infiltrados nas áreas fiscais da União, de Estados e de municípios. O alerta é do presidente do Sebrae, Guilherme Afif Domingos.
 
Em busca de aumentar a arrecadação, eles criam regras impossíveis de serem cumpridas por empresas de menor porte, afirma Afif.
 
Ele se refere a medidas como o convênio 93 do Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária), que criou novas regras para o recolhimento de ICMS na venda ao consumidor final de produtos destinados a Estados diferentes dos de origem das empresas. A regra atinge principalmente o comércio eletrônico.
A regulamentação exige, logo após cada venda, o calculo do valor do imposto devido aos Estados de origem e de destino, a emissão de uma guia de pagamento para cada um deles e sua efetivação antes de enviar o produto.
 
Até o ano passado, o ICMS era pago apenas uma vez ao mês e todo ele era destinado ao Estado de origem.
 
Empresários reclamam que a resolução aumentou a burocracia e seus custos. "Essa norma precisa ser suspensa imediatamente", diz Afif.
 
Folha - Como as micro e pequenas empresas estão se comportando nesta crise?
Guilherme Afif Domingos -  Elas encerraram o ano com um saldo negativo de 224 mil empregos. Até novembro, elas ainda mantinham um saldo positivo de 60 mil vagas, mas dezembro foi um
 
Porquê?
O setor enfrentou problemas de capital de giro. Os bancos reduziram a oferta de crédito nos três últimos meses do ano para fugir do risco. Mas esse é um problema que esperamos reduzir com o pacote de crédito, anunciado em janeiro pelo governo.
 
A Câmara aprovou, em 2015, a ampliação do teto de faturamento para empresas se enquadrarem no Simples, mas ela precisa passar pelo Senado. Qual é a sua expectativa?
No Senado, o projeto passou pela Comissão de Assuntos Econômicos e foi para o plenário, que aprovou urgência da para votação. Ele está na pauta prioritária do Senado.
 
A Receita diz que a medida resultará numa renúncia fiscal de R$ 11,4 bilhões. O sr. discorda desse número. Por quê?
Pelos nossos cálculos, a renúncia fiscal seria da ordem de R$ 5 bilhões por ano. Mas, se o segmento crescer 5%, essas perdas se anulam. À medida que você cria um sistema mais amigável, você aumenta a formalização e atinge um índice de crescimento superior a 5%. Quando todos pagam menos, o governo arrecada mais.
 
Como o governo vem se posicionando em relação à medida, considerando as dificuldades para fechar suas contas?
Por causa desse contexto, vamos resolver primeiro a questão do crédito. Temos de garantir o oxigênio para atravessar o primeiro semestre.
 
Então o sr. considera que a mudança no Simples será discutida mais para frente?
Sim, à medida que a economia melhore. Ou ela pode ser vista como um remédio pa uma crise aguda, embora só vigore no ano seguinte. Neste momento, temos de estar muito atentos à ação dos exterminadores do futuro.
 
Quem são eles?
São as áreas fiscais da União, de Estados e de municípios. Em sua sanha arrecadatória, elas criam regras tributárias que atropelam a Constituição e a lei.
 
O sr. se refere às mudanças nas regras do ICMS?
Isso é de uma irracionalidade imensa. Essas mudanças são um caso típico disso e levaram a OAB [Ordem dos Advogados do Brasil], em parceria conosco e outras entidades, a ajuizar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal para afastar os efeitos nefastos dessa convenção sobre as empresas do Simples. Para você ter uma ideia, uma empresa é fechada por minuto no comércio eletrônico como efeito dessa convenção do Confaz que entrou em vigor no dia 1 º de janeiro.
 
Por que não se considerou esse ponto no momento da edição do convênio?
O Confaz mirou a Americanas.com e esqueceu que 70% das empresas do comércio eletrônico são do Simples, mesmo que representem só 20% do faturamento do setor. Colocou exigências que são fulminadoras da existência dessas empresas. A firma, quando vai vender para outro Estado, agora tem de emitir a nota fiscal no Estado de origem e emitir duas guias de recolhimento - uma para o Estado de origem e outra para o de destino. Como o empresário vai fazer o recolhimento de todas essas guias, seguindo as regras de cada Estado, pagando no banco em que cada Estado determina.
 
Esse trâmite é inviável para micro e pequenas empresas?
Elas deveriam estar fora disso, pois a Constituição exige um tratamento diferenciado. Para as demais, era só criar um sistema de compensação com a nota fiscal eletrônica. Você recolheria em um ponto só e faria o rateio entre os outros Estados. Pronto, é racional. Mas não há racionalidade na cabeça deles, eles querem arrecadar por todos os lados. Mas sabe qual será o resultado? Eles não vão arrecadar nada da micro e da pequena empresa. Das grandes, não vão arrecadar 40% do que previam, pois o volume de vendas vai cair com toda essa burocracia.
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