25/01/2016 - 11:38

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Após uma década, especialistas defendem revisão da Lei de Recuperação

jornal O Globo

No mercado, não é preciso assembléia ou conciliação para que devedores, credores e profissionais que atuam no setor concordem em um ponto: a Lei de Recuperação de Empresas e Falências, que completou dez anos em 2015, precisa passar por revisão. Questões não previstas ou regradas pela legislação vêm se transformando em travas aos processos de recuperação judicial, que ainda afugentam empresários:
 
"Antes da Lei de Recuperação, só havia a opção de concordata. Era gerir bem o negócio ou a falência. Com a legislação, isso mudou. Mas os empresários ainda esticam a corda demais - explica a advogada Juliana Bumachar, especializada em recuperação de empresas e falências".
 
A legislação modernizou o ambiente corporativo no país, mostra pesquisa da Deloitte, do fim de 2015. O estudo diz ainda que as empresas estão se profissionalizando. E que a lei, com a crise e o aumento dos pedidos de recuperação, ajudou a minimizar o número de falências.
 
De outro lado, com o aumento da procura, Renato Franco, da consultoria íntegra, que cuidou do caso Parmalat, diz que cresceu o número de prestadores de serviços de reestruturação: "Há profissionais atuando na área sem a experiência e a qualidade técnica necessárias. Credibilidade é fundamental".
 
A recuperação judicial não é uma solução isolada, mas uma ferramenta que pode ser usada no processo de reestruturação. A empresa que recorre à Justiça consegue alongar dívidas em condições mais vantajosas e se prepara para receber recursos de maneira protegida, explica Luís Alberto Paiva, sócio-diretor da Corporate Consulting.
 
Segunda reestruturação
 
Com o aumento dos casos na Justiça, o advogado Thomas Felsberg, especialista na área, alerta para a segunda onda de recuperações. Ou seja, empresas que saíram da proteção da Justiça e que encontraram um ambiente econômico adverso, levando-as a um novo pedido ou a uma segunda reestruturação. É uma situação semelhante àquela em que se encontra a fabricante de eletrodomésticos Mabe, cliente de Felsberg.
 
Sediada no México, a empresa vende no Brasil produtos das marcas Continental, Dako e GE. Com dívida de cerca de R$ 430 milhões, pediu recuperação em maio de 2013. O plano foi aprovado em outubro daquele ano. Mas, com as dificuldades econômicas enfrentadas nos últimos meses, a empresa teve de pedir novo aval aos credores.
 
"Tivemos de repactuar a dívida e fazer um novo acordo com os credores ano passado, pois o plano, do jeito que estava, não era possível", diz Felsberg. "Empresas que saem da recuperação judicial estão em convalescença. Se encontram um ambiente econômico fragilizado, podem retroceder".
 
A questão bancária é o problema mais citado por recuperadores e advogados.
 
"Os bancos fazem contratos de empréstimos com alienação fiduciária. Quando a empresa entra em recuperação, o que ela recebe é alienado em favor dos bancos. Eles ficam com a prioridade dos recebíveis e atrapalham a geração de receita. A lei é complacente", conta Gustavo Licks, administrador judicial de empresas, que atuou na recuperação da operadora de turismo Marsans.
 
Paiva cita outro problema. Segundo ele, diversos tipos de dívida não são cobertos pela lei: "Mal conseguimos enquadrar metade dos passivos na recuperação. Quase 70% da dívida de uma companhia são com bancos".
 
A OAB/RJ conta com uma comissão já discutindo propostas para a revisão da legislação: "Há diversos pontos a serem revistos, como o parcelamento fiscal, a relação com os bancos, a situação das transnacionais e outros. Estamos trabalhando para elaborar um anteprojeto para ser apresentando em conjunto pela Seccional do Rio e a OAB Nacional ao Congresso", explica Juliana, que atua nas comissões da OAB carioca e Nacional. "Há também uma sobrecarga sobre o Judiciário".
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