04/10/2018 - 10:00 | última atualização em 03/10/2018 - 18:50

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#30AnosdaCF88: Garantias de igualdade e liberdade para todos

redação da Tribuna do Advogado

          Foto: Lula Aparício  |   Clique para ampliar
 
Nádia Mendes
Após o período de 21 anos em que a ditadura civil-militar restringiu as liberdades individuais e os direitos dos cidadãos, a Constituição veio, em 1988, coroar o período de redemocratização iniciado em 1985. O artigo 5º, que trata dos Direitos e Garantias Fundamentais, cravou que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza” em uma série de termos que garantem aos brasileiros e estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.
 
Já no primeiro inciso desse artigo, a Carta estabelece a igualdade, em direitos e obrigações, entre homens e mulheres. A inclusão desses temos é uma vitória do chamado “lobby do batom”, como ficaram conhecidas as deputadas que fizeram parte da Constituinte. Trinta anos depois pode-se perceber que essa igualdade ficou restrita à lei. Em novembro de 2017, o Brasil amargou a 90ª posição na lista do Fórum Econômico Mundial que analisa a igualdade de gênero em 144 países. O estimado é que a sonhada igualdade leve cem anos para ser alcançada.
 
Foto: Bruno Marins|   Clique para ampliar
Independentemente de a igualdade não ter sido plenamente alcançada no país, é importante destacar os ganhos em relação aos direitos das mulheres pós-88. Segundo a presidente da OAB Mulher da Seccional, Marisa Gaudio, entre as principais inovações estão a inclusão de alguns direitos trabalhistas – como a proibição de diferença de salário, admissão e função por motivo de sexo, por exemplo. “Outra grande vitória foi a ampliação da licença maternidade para 120 dias, sem prejuízo do emprego e do salário, além da criação da licença paternidade”, disse, lembrando também do reconhecimento da união estável como entidade familiar e que, com a Constituição, homens e mulheres exercem, igualmente, os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal.
 
Temos que trabalhar pela igualdade de salários e oportunidades
Marisa Gaudio
 
Ao longo dos anos, legislações específicas foram criadas para efetivar os princípios previstos na Constituição, como por exemplo a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio. Segundo Gaudio, ainda é necessário, entretanto, a proibição de salários desiguais entre pessoas com o mesmo grau de estudo e experiência profissional, além de estabelecer investimentos públicos mínimos no combate à desigualdade. “Precisamos de mais investimentos nas políticas públicas para prevenir, punir e erradicar a violência doméstica”, disse. Outros pontos que, segundo ela, precisam de mais atenção do legislador são os direitos reprodutivos e a igualdade entre licença maternidade e paternidade.
 
Para os próximos anos, os desafios são no sentido da efetivação do que está previsto na Constituição. “Buscar o fim da violência com a efetivação da prevenção, aplicando a Lei Maria da Penha, efetivação da punição aos agressores em todas as modalidades de violência contra a mulher, não apenas física. Temos que trabalhar pela igualdade de salários e oportunidades. Apesar da nossa lei maior prever a igualdade, a sociedade, incluindo operadores do direito, ainda não os respeitam. Dessa forma, vamos conseguir a erradicação das desigualdades em razão do gênero”.
 
Liberdade para amar e ser
 
Foto: Bruno Marins |   Clique para ampliar
A Constituição de 1988, tirou o casamento como constituidor de famílias, passando a valer o afeto. A família foi colocada como a base da sociedade. “Disso nós tiramos o princípio das pluralidades famílias, já que não se pode negar a existência de outros vínculos familiares, como famílias constituídas de irmãos, avós e netos, por exemplo”, explica a presidente da Comissão de Direito Homoafetivo da OAB/RJ, Raquel Castro, destacando que a partir dessa interpretação do afeto como elemento constituidor da família que em 2011 o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu as famílias homoafetivas. “Não há nada na Carta Magna que impeça que pessoas do mesmo sexo venham a constituir família”, reforça.
 
Mesmo considerando o texto moderno, Castro classifica como um sonho que fosse aprovada uma emenda para que no artigo 3, que fala da proibição de discriminação por raça e cor, fosse acrescida também a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero. “O que falta no Brasil hoje é a criminalização da homolesbotransfobia. Quando a Constituição abarcar essa questão ficará mais fácil aprovar uma lei que puna crimes de ódio ou até mesmo que isso vire um agravante no crime de homicídio”, defende. Já existe uma Proposta de Emenda Constitucional em curso nesse sentido. A PEC 111/2011, de autoria da Senadora Marta Suplicy (MDB/SP), é oriunda de um anteprojeto criado pela Comissão Especial da Diversidade Sexual do Conselho Federal da OAB (CFOAB).
 
O que falta no Brasil hoje é a criminalização da homolesbotransfobia
Raquel Castro
Além da criminalização da homolesbotransfobia, Castro acredita que é necessário alterar a licença maternidade. “Como mudou a concepção de família, a gente precisa alterar a licença prevista em lei para que ela seja concedida a qualquer um dos pais. Um casal de mulheres ou de homens pode, por exemplo, dividir o tempo da licença. Essa mudança estaria abarcando outros modelos familiares que poderiam exercer esse direito. É interessante ter essa previsão para dar mais legitimidade. Uma clareza constitucional facilita muito a mudança de paradigma”, ressalta.
 
Também elaborada pela Comissão Especial da Diversidade Sexual do CFOAB, A PEC 110/2011 dispõe sobre licença-natalidade, licença após adoção e veda discriminação de trabalhador em virtude de orientação sexual ou identidade de gênero. A PEC estabelece que a licença seja concedida a qualquer um dos pais e tenha duração de 180 dias
 
Liberdade para professar – ou não – a fé
 
Foto: Bruno Marins |   Clique para ampliar
No artigo 5º, inciso VI, o constituinte estabeleceu como inviolável a liberdade de consciência e de crença, assegurando o livre exercício dos cultos religiosos, além de garantir a proteção aos locais de culto e liturgias. Já o inciso VII constituiu que ninguém pode ser privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política.
 
O principal desafio para os próximos anos é  a manutenção do Estado democrático de Direito
Guiomar Mairovitch
A presidente da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa da OAB/RJ, Guiomar Mairovitch, classifica a Constituição como analítica. Segundo ela, o texto traz uma abordagem perfeita sobre todos os temas da sociedade e que permanece moderna mesmo depois de trinta anos. “Na minha concepção não há qualquer defasagem sobre a questão da liberdade religiosa. O que tem que ser modernizado é a mentalidade das pessoas que não respeitam os direitos alheios e fazem questão de viver à margem da democracia”, destaca, lembrando que, além de consagrar a liberdade religiosa, a Constituição também resguardou a laicidade do Estado.
 
Para Mairovitch, o texto constitucional contempla muito bem a questão da liberdade de culto no país, mas ainda falta conscientização da importância do respeito do direito de professar qualquer – ou nenhuma – fé. “O que precisa ser trabalhado de forma preventiva é o diálogo, a informação, através da educação e, quando necessário, repressivamente o desrespeito e a intolerância. O principal desafio para os próximos anos é conseguir a manutenção do Estado democrático de Direito”, defendeu.
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