Vírus, epidemias e pestes frequentemente inspiram as artes em várias de suas manifestações, e é inegável a força do apelo que exercem pelo medo. Afinal, as desgraças causadas por epidemias não foram poucas e já eram registradas desde o século XIV, tais como a peste negra e a gripe espanhola, entre outras menos abrangentes, que deixaram extraordinário número de mortes. 

Considerável número de filmes que compõem o gênero “cinema-catástrofe” encontram-se disponíveis, entre eles os que têm epidemias de pestes ora como tema principal, ora como pano de fundo – talvez pelo medo de que certos fatos se repitam. Seguem dois exemplos:

 O ‘thriller’ “Vírus” (2009), dirigido por Alex e David Pastor: sob ataque de um vírus, alguns jovens norte-americanos fogem a procurar refúgio no México. Abro parênteses para relembrar que esta não é a primeira vez que a ficção coloca o México como lugar de refúgio de norte-americanos em momentos de catástrofe. Vale conferir, a propósito, o filme “O dia depois de amanhã” (2004), de Roland Emmerich. Não resisto à tentação de associar a ficção com a realidade da ideia, felizmente abandonada, de construção de um muro para impedir a entrada de cidadãos mexicanos nos Estados Unidos. 

Outro do gênero é “Fatal contact: Bird flu in America” (2006), direção de Richard Pierce. Aborda os efeitos da mutação de um vírus em gripe aviária. Ainda, “Contágio” (2015), direção de Henry Hobson. A destacar, o amor de um pai pela filha transformada em zumbi.

Mas, é na literatura que se encontram minhas preferências quando se fala de vírus. Recomendo o extraordinário “Ensaio sobre a cegueira”, ficção do português José Saramago. Dentre outras virtudes, a importância que é atribuída ao ser feminino naquele imaginado mundo de cegos após uma epidemia.  Nem todos apreciam o estilo da redação ‘sui generis’ de Saramago, sem compromisso com as regras de pontuação, mas que ele usa com maestria. E o conteúdo é de uma riqueza de figuras e de simbolismos provocantes, desafiadores.

Finalmente, outra de minhas leituras mais queridas: ‘O amor nos tempos do cólera’, de Gabriel García Marquez.

 A relembrança desta obra me veio, obviamente, do estado em que nos deixa essa nova tragédia, desta vez, pela pandemia do novo coronavírus, a temível covid-19. O medo domina nosso pensamento em razão da quarentena e o isolamento – indispensáveis, mas que nos levam ao horror de pensar que podemos nunca mais ver, abraçar e acariciar um ente querido, um ser amado... No entanto, a obra de García Marquez fala de um amor, antes impossível, que só pôde ser vivido e se aperfeiçoou nos tempos da epidemia do cólera, dando razão, quem sabe, à Bíblia Sagrada, no dizer que “o perfeito amor lança fora o medo” (I Carta de João, 4:18).

Esse amor incondicional aplica-se aos inúmerxs profissionais da saúde e voluntárixs  que, a despeito dos riscos de contágio, dedicam-se incansavelmente a abrandar o sofrimento e a tentar salvar as vidas de seus semelhantes nestes difíceis tempos. Nosso eterno reconhecimento.